Hoje fui andar pela rua, com máscara e mantendo aquele cuidado
com a distância de outras pessoas, encontrei, sentado numa mureta dessas que
ficam embaixo das vitrines, do lado de fora da loja, um homem com uma
fotografia na mão direita, olhava para ela conversando e acariciava a foto com
a outra mão. A vitrine atrás dele mostrava roupas femininas.
Parei instintivamente e fiquei olhando a vitrine, mas atento ao
homem da mureta com cara de apaixonado. Ele me olhou com aquele olhar perdido e
disse: Eu olho a fotografia e sinto o desejo de conversar com ela, a fotografia
mesmo!, dá vontade de saber o motivo desse sorriso gostoso, essa expressão de
alegria, a espontaneidade dos gestos, o corpo todo que parece se mover, com uma
lata de refrigerante na mão sempre a me oferecer: quer?
Quero! Ele disse com um sorriso incontido. Quero tomar do
refrigerante, pegar na mão e já que esses olhos são tão lindos, quem sabe não
posso passar a mão pelos cabelos e acariciar o rosto. A fotografia continua
sorrindo e os olhos dizem que sim. Pode, pode sim! A fotografia, ele continuou
dizendo, traz a praia para dentro desta rua e eu mergulho nas ondas e nesse vai
e vem até me afogar nesse mar de ilusões. Não há matemática que explique essa
distância tão grande que estou desse lugar em que mergulhei, toco o infinito e
há um infinito entre eu e ela.
Não resisti a esse comentário. É um poeta! Só um poeta consegue conversar
com uma fotografia com tanto sentimento. Me aproximei e olhei para a mulher da
foto, era muito bonita mesmo, não sei precisar a idade, mas que importa a idade
se o olhar é sereno e alegre, o rosto expressa um sorriso maravilhoso e o corpo
parece mesmo estar balançando numa música jovial, com uma lata de refrigerante
na mão, estendida para mim, quer dizer, para o poeta da mureta da loja de
roupas femininas.
Gostou? A pergunta quase me derrubou, me escorei na vitrine e
fui me sentando na mureta ao lado do poeta, sentando e levantando e andando de
lado até ficar à uma distância segura. Na
matemática do amor parece que as equações nem sempre dão o resultado esperado,
continuou o poeta, tem sempre uma variável indeterminada ou uma função
infinitesimal, principalmente se a incógnita for uma paraguaia! Ela é
paraguaia? É, sim, e veio para o Brasil só para me atentar! É a tua esposa?
Quem dera!
‘Quem dera!’ foi a expressão mais triste que já ouvi em toda
minha vida. Pensei em consolar o poeta, mas para que? Não me senti no direito
de tirar a poesia que estava com ele. Levantei-me e fui pela rua procurando
poesia nos rostos das pessoas. Que falta me faz uma fotografia!
Elairton Paulo Gehlen
Eu amo fotografia..ate aprendi tirar fotos fazer enquadramento. Mas busco no sorriso daquela foto...o seu.
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