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quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

ANO NOVO, ANIVERSÁRIO DE QUEM?

      


   
    

Quando completamos mais um ano de vida, chamamos a isso de aniversário. Todo mundo quer comemorar a idade nova, acrescentar mais um aos anos vividos e alimentar esperanças de que com a experiência dos dias passados saberá viver melhor os dias futuros. E haja dias passados para uma senhora que foi registrada com data de nascimento do ano de 1.927!

Ela me disse que nasceu mesmo foi em 1.931, mas a certidão teve um pequeno ajuste para que ela pudesse ir para a escola antes de completar os cinco anos de idade, comprovando já ter oito, requisito necessário para ser matriculada no ensino regular na época. Então, podemos concluir que dona Constantina tem entre 89 e 93 anos de experiência, algo em torno de trinta e três mil dias de vividos.

E hoje é ano novo! Se dona Constantina tivesse nascido no dia primeiro de janeiro, poderíamos aproveitar a festa e comemorar o seu aniversário, mas não, seu nascimento, pelo menos oficialmente, data de 5 de abril. O mundo inteiro comemora um ano novo na data de hoje, aniversário de quem? Do mundo? Não há um registro para a data do seu nascimento, ainda que tenhamos informações sobre a criação ou uma provável explosão que faz o universo expandir infinitamente, não há uma data de aniversário para o mundo.

Dona Constantina, mais de trinta mil dias de vida, tem uma data incerta no registro e pode comemorar, talvez duas datas diferentes. Quando o Alzheimer não faz confusão nas ideias, ela é a pessoa mais doce do prédio e fica toda animada lembrando dos professores Maia e Elvira que a queriam na escola e providenciaram sua certidão de nascimento com idade adequada. O pai, adotivo, foi morto no processo da Revolução Constitucionalista de 1.932, quando ela completara seu primeiro ano de vida, uma marca para essa nonagenária que agora vive entre o real e o imaginário.

Tem um ditado popular que diz que depois dos sessenta anos, contamos a idade para trás, diminuindo um ano em vez de somar. Assim, Dona Constantina agora é quase uma Balzaquiana! O mundo que, não sei porque cargas d’água, comemora ano novo hoje também já passou por isso. Até o nascimento de Jesus, a história registra os anos em contagem regressiva. O filósofo Sócrates nasceu no ano 469 e morreu em 399! Há poucos minutos fui até o apartamento da nossa personagem para tirar uma foto e ela me pareceu tão jovem! Talvez ela nem dê importância para o Alzheimer e aproveite para comemorar cada dia como se fosse o dia do seu ano novo! Parabéns dona Constantina!

terça-feira, 29 de dezembro de 2020

QUEM SÃO OS NOSSOS HEROIS

No dia de hoje, há 156 anos, morria em combate um dos ‘nossos’ heróis: Antônio João Ribeiro. Há estátuas do militar espalhadas por muitos lugares, até mesmo no Rio de Janeiro, então capital do Brasil.

Comandante da Colônia Militar de Dourados, que nunca foi em Dourados, mas na localidade onde hoje está o Município de Antônio João, nosso herói foi morto em combate contra as forças militares paraguaias, no dia 29 de dezembro de 1864, no contexto conflituoso que levou à Guerra da Tríplice Aliança (1865/1870), onde Brasil, Argentina e Uruguai, patrocinados pelo Império Inglês, derrotaram os Hermanos numa luta inglória e atroz. O saldo? Quase 75 por cento da população paraguaia foi dizimada! Um verdadeiro genocídio!

Enquanto a cantilena do heroísmo vai se espalhando pelos textos escolares, os governos de elite inauguram estátuas e a mídia venal publica inumeráveis reportagens mostrando sempre a opinião de quem venceu. O povo ficou por muito tempo achando que paraguaio é preguiçoso! E, essa cultura de que os derrotados são maus não é exclusividade desse povo chacinado que ainda hoje paga preço alto pela guerra de século e meio atrás.

Negros, pobres e trabalhadores em geral não podem ser heróis de verdade! A história de Dourados está fortemente ligada a produção de erva mate, pela Companhia Mate Laranjeira que explorava mão de obra principalmente paraguaia e indígena e de alguns migrantes brasileiros que por aqui desembarcavam em busca de uma vida que pudessem virtualmente chamar de digna.  

Num esforço histórico de reconhecimento desse herói, foi inaugurado e posto na avenida central de Dourados uma estátua do Ervateiro em labuta com seus até duzentos quilos de erva amarrados às costas. Foi muito atrevimento, poucos anos depois a homenagem foi considerada inapropriada e o Ervateiro literalmente expulso da vista dos transeuntes, tempos depois encontrei o ex-herói num parque, trancado atrás de um portão, com um imenso cadeado! Parecia muito perigoso!

E o centro da cidade? Ah, sim, tomado por avenidas com os nomes de proprietários imensas áreas de terras, expropriadas dos indígenas, para criação de gado, e políticos incompetentes. Os heróis, de quem?

segunda-feira, 28 de dezembro de 2020

ESTÃO COMEÇANDO AS DESPEDIDAS

             Está um alvoroço nas repartições públicas municipais onde novos comandantes devem tomar posse do cargo ainda nesta semana. Funcionários concursados ainda dormem o sono dos anjos, mas uma leva de comissionados desejariam que dois mil e vinte nunca acabasse, mesmo com essa pandemia que para muitos é fichinha perto do lhes espera com a chegada do adversário político que vai se tornar chefe em três dias.

Eu, ainda, sou presidente de uma Associação de Produtores Rurais da Agricultura Familiar e, como tal, vez e sempre ando por alguns corredores da administração municipal e já há tempos percebo a inquietação. Antes das eleições tinha comissionado fazendo campanha para dois candidatos, o que se encontrava em primeiro lugar nas pesquisas e o segundo que apostava numa virada de última hora. Ufa! Acho que me salvo, desabafou um desses barnabés, esforçando-se por esconder os votos que pedira ao provável eleito, derrotado pelo voto útil.

Ter funcionários de confiança é fundamental em qualquer atividade que se tenha necessidade de auxiliares para o desempenho das funções que são atribuídas, mas no poder público, parece que isso de ‘confiança’ é ainda mais importante. Em inícios da década de dois mil, fui investido de um desses cargos comissionados na prefeitura municipal e, todo orgulhoso e cheio de idealismo, passei a gerir um setor até bem importante na Secretaria de Fazenda. Quer dizer, tentei gerir um setor bem importante. Mesmo já tendo militado por longos anos na política e feito centenas de análise de conjuntura, não tinha eu ainda me dado conta da realidade do que os sindicalistas mais combativos chamam de ‘chão da fábrica’ da democracia.

Enquanto escrevo estas mal traçadas linhas, tem dois funcionários de uma empresa terceirizada instalando um aparelho de ar condicionado aqui no apartamento. Quem fiscaliza o trabalho deles? Eu, o principal interessado no serviço. Exatamente neste mesmo momento, tem dezenas de empresas terceirizadas prestando serviços para a sociedade e sendo pagas pelos administradores municipais com o dinheiro do contribuinte, no caso, eu de novo. Mas, quem fiscaliza?

Acho estou entendendo porque se gasta tanto dinheiro nas campanhas eleitorais!

sábado, 26 de dezembro de 2020

AMOR COM HORA MARCADA

O sábado já anoitece o dia e a senhora que ainda se acha senhorita depois do segundo divórcio, esquecida dos cuidados com a saúde em tempos de pandemia, retoca a maquiagem e aperta os lábios para uniformizar o batom, depois olha o espelho virando-se de um lado e do outro, conclui que está tudo bem, calça os salto alto e sai para a sala onde pergunta ao namorado: Pode o amor ser infinito se nem contamos o tempo durante o amor?

Pode, responde o experiente namorado que já se divorciara três vezes. O amor pode ser infinito enquanto dure, segundo o Poetinha, mas pode ser manso e terno, não se irrita e tudo suporta. Pode até ter hora marcada com precisão de minutos e segundos. Sim, o amor não é impreciso, de tão verdadeiro que é, não se atrasa e nem se ufana, mesmo sendo paciente e bondoso. Se passar das 21 horas, 6 minutos e 9 segundos, não é o amor que não se alegra com a injustiça, pois é injusto a quem esteja esperando, esperar além dos segundos combinados.

E tem que ter um abraço pronto a ser dado um minuto após o horário marcado, que entre a chegada e o aperto contra o peito tem a liga do sorriso que vem dos olhos e aperta os lábios no beijo pontual. E aí sim, ah, aí vem o abraço e não tem hora marcada para desabraçar. Os corações se tocam e trocam batidas ritmadas fazendo música para a alma e o sangue jorra o calor do corpo sobre todas as células fazendo os pelos se arrepiarem.

Alguma coisa no cérebro produz um elemento sedativo e as mãos tomam decisões por conta própria e vão alisando as costas e causando arrepio na nuca, até uma se esconder debaixo dos caracóis dos teus cabelos e a outra ir livremente procurando lugares proibidos que censura só existe se a cabeça estiver pensando, e os pensamentos, devidamente instalados no infinito do tempo que deixou de existir já não pensam mais. São 21 horas, 7 minutos e 9 segundos!

O tempo está parado! Nem a física quântica consegue explicar as probabilidades em um tempo que deixou de existir. Assim é o amor num sábado, às 21 horas, 6 minutos e 9 segundos e enquanto o relógio dá uma volta no ponteiro maior, dois corpos são abduzidos para outra dimensão.  Um lugar onde o tempo não conta, por isso pode sim, ser infinito. E, agora que estamos no tempo certo, deixemos a certeza de lado e vamos viver a eternidade de cada momento que amanhã, quando o dia clarear, talvez tenhamos que acertar nosso relógio que não terá marcado mais que um minuto!

quinta-feira, 24 de dezembro de 2020

ENTÃO É NATAL, ÀS VEZES O PRESÉPIO ATRAPALHA

             O Natal é uma data quase tão comemorada quanto o ano novo na sociedade ocidental. É um verdadeiro culto ao deus momo! Só vale a pena celebrar o nascimento de Jesus num lar cristão se, antes, alimentar o principal inimigo de Jesus, o consumismo!

Mas, de onde vem o Natal? Tem aí algum cristão que saiba fundamentar biblicamente a data? Não, né! Por mais que se queira o Natal como data cristã, ela não tem nenhum fundamento bíblico e, ao contrário, surge da adoração a deuses pagãos. Foi uma adaptação feita à cultura grega e mesopotâmica antiga de celebração do solstício de inverno, no hemisfério norte, quando ocorre a noite mais longa do ano e, daí em diante o sol terá mais tempo de luz beneficiando a agricultura e gerando abundância para as famílias. Nesta data celebravam-se cultos aos deuses Dionísio, deus do vinho e da vida mansa (Gregos) enquanto os egípcios celebravam a passagem de Osíris para o mundo dos mortos.

Mas, Jesus nasceu, isso é fato, e era inverno e, se há generosidade nesse fato é a permissão para que José e Maria passassem a noite num estábulo onde o Messias nasceria entre os animais irracionais, aquecido pelas palhas de sua alimentação. As ruas da cidade tem “estábulos” de papelão esparramados pela rodoviária, pelo comércio que tranca as portas das lojas cheias de roupas e cobertores deixando do lado de fora mendigos friorentos, dos consultórios médicos que jogam no lixo o juramento de Hipócrates e atendem quem tem trezentos reais para a consulta e deixando morrer à mingua os Messias em seus “currais” urbanos e supermercados fartos de alimentos barrando a entrada de pobres famintos.

Então é Natal e eu me lembro de uma igreja animada que desejava fazer um presépio ao ar livre mas o local escolhido estava ocupado por uma família de paraguaios que  ali se alojaram com suas quatro crianças e não houve argumentação cristã que os fizesse sair daquele lugar, nem mesmo por uns dias ‘ até depois do Natal’. Era lugar de grande circulação de pessoas e tanto crentes quanto excluídos tirariam dali os resultados a que se propunham, uns atrair fiéis para sua igreja, outros o dinheiro das esmolas para o sustento da família.

É natal e as casas das pessoas abastadas ficam abestadas com a fartura de comida e bebida com os portões trancados e uma placa na porta indicando uma empresa de segurança. É o medo que a própria riqueza produz, medo da pobreza. Jesus era pobre e a elite romana tinha medo!

FORA DA CAIXINHA

Não há tempo que não possa ser medido, pelo relógio. Ainda que esteja perdido, desencontrado, não há tempo, que não possa ser achado.

 

E se o tempo, esse ditador implacável, algum dia for encontrado, distraído, quase parado, aproveitemos, para fazer o que parece errado, que não contando o tempo, por certo será tomado!

 

Sendo certo, ainda que errado, não havendo tempo, não terá um depois para ser cobrado. E o infinito se faz, quando o tempo está parado!

 

Procuremos pelo não-tempo, e sejamos felizes! E ai do relógio, se por algum motivo, retomar a contagem do tempo, nos deixando em sério perigo!

 

Melhor seria não o ver, deixar-se distraído, que não havendo o tempo, tudo é permitido!

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

O ESPÍRITO DO NATAL!

Que o Natal está ‘bem ali’ não resta nenhuma dúvida, mas se há algo questionável é: O que faz o espírito nisso tudo que vemos das comemorações do Natal?

Deixo este primeiro parágrafo somente com esse questionamento e vamos ver o que acontece quando buscamos os significados da palavra ‘espírito’. Então, que seja! Quando ouvimos a musiquinha do Gingle Bells, à que recorre imediatamente nosso espírito? Ganhou uma bala quem disse: comércio! O espírito comercial é que é o verdadeiro espírito natalino! Movimenta milhões em vendas, aumenta cada ano as cifras e, intimamente associado ao espírito da mentira oferece produtos totalmente inúteis e desnecessários a consumidores ingênuos. E vende!

Filosoficamente, espírito é o conjunto de todas as faculdades intelectuais. Andei um pouco pelas ruas com essa definição diante de mim e fui associando o que seriam essas tais de ‘faculdades intelectuais’ nos transeuntes, comerciários, comerciantes, etc. e até neste mero escrevinhador de espírito desassossegado. Um senhor de cabelos grisalhos andava ereto puxando pela mão direita uma senhora de vestido florido e atrás deles dois jovens adultos, do tipo nem, nem, nem. Enquanto o pai reclamava do espírito de ganância dos comerciantes, a mãe dizia que não dava para ter Natal sem um presente que alegrasse o espírito da família, já os jovens, que não tinham nenhum espírito para o trabalho, só esperavam ganhar celulares novos.

A moça em seu terninho bordô na porta da loja de óculos convidou para experimentar as novas armações importadas da Itália e que estavam em promoção até o Natal. Eu disse que não precisava trocar meus óculos, mas ela imediatamente agendou uma consulta com o Optometrista que atendia ali mesmo na loja e me aguardava para o atendimento em dois minutos. É o espírito do Natal, ela disse, você não pode perder essa oportunidade. Eu ainda não tinha se quer entrado na loja!

No ponto de ônibus com destino ao Bairro Parque Alvorada, Seu Jurandir esticava o pescoço para ver se o ônibus que vinha era o seu, enquanto Dona Fátima, que falava sempre cinco palavras a mais que as que pensava, ia elogiando o dono da loja que lhe vendera as roupas que usaria no Natal em família. Comprara bem mais do que planejara e podia pagar, mas o dono da loja dissera que era importante ter mais opções e logo propôs o crediário em dez pagamentos, que o marido assinou totalmente a contragosto. Logo embarcariam no ônibus dois espíritos unidos em matrimônio: O Fantasma do consumismo e a Assombração do endividamento!

Escutei um ‘plinc’, tirei o celular do bolso e abri a mensagem: “Espírito natalino, é o que fecundou a virgem e lhe nasceu o salvador, desnudo, pobre e humilde”.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

PÁTRIA AMADA DOURADOS

Esta idosa cidade que já completou seus oitenta e cinco anos parece estar fazendo jus ao texto bíblico que diz que outra pessoa te vestirá e te conduzirá para onde não queres ir. Se fosse uma pessoa, de fato o é, ainda que não física, mas jurídica, dado que possui CNPJ 03.155.926/0001-44, ainda assim é mesmo uma pessoa e como tal chega a terceira idade como quem não tem mais condições de se cuidar e sofre com os filhos mal-educados que só pensam em dilapidar seu patrimônio acumulado ao longo de anos de trabalho.

O Decreto número 30, do então Governador do Mato Grosso, Mário Correia da Costa registrou o nascimento desta Cidade que gestava desde 1.861 quando foi fundado o Comando Militar de Dourados, sob a batuta de Antônio João Ribeiro, para guerrear contra os irmãos paraguaios que, bastante desenvolvidos, faziam ciúmes aos interesses do capitalismo Inglês. Prenhez de longa duração, contou com a ajuda dos gaúchos, mineiros e paulistas que para cá vieram atraídos pelas terras baratas e altamente produtivas. Já quase para nascer, Dourados viu a barriga crescer com a exploração da erva mate pela companhia Mate Laranjeira que monopolizou a extração desse produto até meados da década de 1.920.

Entrando em trabalho de parto, passa a ser pacienciosamente atendida pela equipe do pecuarista Marcelino Pires, dono de vastíssima área onde criava gado em terras anteriormente ocupadas pelos povos nativos. Hoje, a principal avenida desta octogenária homenageia o Tal! Oficialmente, os heróis do município são destacadamente os que mais contribuíram para a destruição da natureza.

Ainda bebezinha, Dourados já era tutelada com o fim de acolher pessoas aguerridas, dispostas a promover o desenvolvimento local. A Colônia Agrícola de Dourados – CAND, foi o mais generoso projeto de reforma agrária que este país teve, ainda na década de 1.940. Acolheu milhares de famílias nordestinas e de outros estados do Sul e Sudeste, assim também imigrantes que receberam terras e depois foram cuidadosamente expulsos pela ocupação das lavouras de soja e milho, pelo agronegócio que não mais produz alimentos, senão commodities que imediatamente após a colheita deitam em armazéns esperando pelo melhor preço antes de serem exportados.

Deixei passar pelo menos um dia depois do aniversário para publicar este texto, dado que ele destoa um pouco das inumeráveis homenagens elogiando esta belíssima cidade que se encontra cheia de matagal em quase todas as áreas públicas e ao desejado modelo do traçado das ruas esburacadas e, ainda, talvez, só talvez, pela maior reserva indígena brasileira, símbolo da vergonha de nossos governantes que em defesa do progresso material, produziram o caos e a miséria entre os povos nativos, verdadeiros donos deste lugar.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2020

O AMOR EM TEMPOS DE PANDEMIA

Em tempos de pandemia não há muito que se relatar em termos de amor, pelo menos não para amores que sejam descritos em crônicas de fim de semana e causem pelo menos algum alvoroço entre as partes envolvidas e que não seja alvoroço de pandemia! Mas de amor fogoso, daqueles que põe em perigo pelo menos a índole de uma das partes e depois do fato consumado fique uma história que valha a pena ser contada inúmeras vezes para os filhos e netos quando já não se tem mais aventuras na vida.

Quieto no meu isolamento, assando pão e assistindo filme na televisão, decidi que, não tendo uma história para contar, ficaria na frente da telona até que o mundo acabasse em 2.012, o filme! Acabou. Quase! Quase também ficaria sem a crônica, não fosse apenas um filme de ficção, e uma mensagem real no WhatsApp: Sabe quem está namorando?

Não sou muito afeito a fofocas, mas saber que a Catarina está namorando, nem sei se isso pode ser considerado fofoca, talvez uma prova de que milagres acontecem! Explico: Catarina, uma senhora muito distinta, mãe de família que, após criar seus cinco filhos despediu o último para um casamento dos sonhos com a herdeira de uma bela fazenda em Aparecida do Taboado, onde com toda essa nova riqueza, será um príncipe entre os vinte e dois mil habitantes daquele município.

Dito isso, vamos ao caso que me foi contado em segredo e em segredo continua. Tendo uma boa casa e uma vida confortável, Dona Catarina não tinha do que reclamar. Mas, após o Júnior se casar e mudar para Aparecida do Taboado, a sensação de casa vazia fez ela lembrar do falecido marido e sentir saudades de quando faziam amor e tinham que interromper e recomeçar depois de atender ao chamado de um dos filhos.

Para espantar a solidão, fazia tricô e crochê todos os dias e à noite depois da última novela, então lia a Palavra até o sono embaralhar as letras daí ia dormir. Tudo ia bem até a última quarta-feira quando não desligou a televisão e foi até a geladeira onde deixara uma garrafa de cerveja, ia tomar uma para espantar a tristeza, e era tanta que não tinha vontade de fazer tricô então foi mudando os canais da televisão até que, já tomada quase toda a garrafa, sintonizou no Canal Brasil e assustou-se com as cenas de sexo explícito, quis mudar o canal, mas a carne venceu rapidamente a luta contra o espírito e no dia seguinte animou-se e publicou um perfil  num site de namoro on-line!

Parece que homens tarados não faltam neste mundo! Consta a fofoca, devidamente documentada no meu celular, que a cinquentona, quase sexagenária dona Catarina, agora é dia sim dia não no salão de beleza e a vizinhança faz plantão para saber que tipo vai estacionar o carro no meio fio.

Isso é verdade? Ainda não recebi a confirmação.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

EU NÃO GOSTAVA DO NICANOR

Como eu poderia gostar do cara que andava num Chevete antigo escutando música clássica e falando que no comunismo era assim, música de qualidade para o povo que se tornará culto! Aquela carona que você me deu na frente do Jornal O Progresso, onde tu trabalhavas e me levaste até minha casa foi certamente a carona mais esquisita que já peguei. Eu escrevia poesias e andava de bicicleta e dava aulas de matemática, mas tu já eras jornalista e estavas escrevendo um livro! Como eu poderia gostar?

Agora me vem tu com essa de morrer infartado! Primeiro deverias me explicar porque publicaste só a metade do meu artigo na revista Arandu. Aquela história de que era muito grande não colou. A revista era quase um livro e o meu artigo não passava de dez páginas! Nunca mais escrevi nada para ti, mesmo você prometendo deixar o espaço que eu quisesse na próxima edição. Mesmo assim, devo reconhecer que tua revista foi um sucesso!

Me perdoem os leitores desta crônica, mas meu amigo morreu hoje (ontem, no caso) e eu estou aqui lembrando de quando o Nicanor tomou de empreitada a fundação da Academia Douradense de Letras e me disse que queria que eu lançasse logo meu livro para entrar na academia e eu teimei em não faze-lo que não o faria só para isso, que um livro é como um filho e ninguém faz um filho só para poder se casar com a mãe dele. Desculpa aí Nicanor, agora já lancei dois livros e o terceiro está pronto e o quarto pela metade e eu ainda não sou acadêmico, mas tenho grandes amigos lá e a academia até já fez festa de confraternização na minha casa e tu não foste.

Eu li e reli teu livro de poesias, Vida Cachoeirinha, que está bem aqui do meu lado e faz muito sentido para mim porque conheci o miserê daquele bairro e fui medir terrenos com vinte centímetros de lama na ocupação do União Douradense que fica bem ao lado e se parece muito. Tem vida no Cachoerinha e tem um processo revolucionário no União Douradense. Nós queríamos fazer a revolução na época do PCB, lembra? Ah, não! Agora já não podes mais lembrar...

E o meu livro que tu falaste que ias publicar e nunca publicaste? Tenho a foto de quando nos reunimos para tratar da edição e até combinamos a data do lançamento. Nunca aconteceu! Eu fiquei bravo, mas tu continuaste sendo meu amigo no face e até continuaste a mandar mensagens pelo WhatsApp. Brigaste comigo na feira porque lancei o livro por outro editor. Agora não vai mais dar!

Só mais uma coisinha, meu caro Nicanor: Se tu continuares a publicar a revista Arandu, aí para onde estais indo, deixa um espaço reservado que quando eu também for, prometo que vou escrever o artigo, mas só se você prometer que vais publicá-lo na íntegra! Vai em paz, me caro!

quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

O NÃO TEMPO

 

Quando não sei o que quero
E não quero saber o que não sei
Tomo conta do tempo
E ele para!
Aí eu tomo uma cerveja
E o tempo...
Fica lá...
Esperando...
Já não é mais
Eu sou!
Deixei de querer
O tempo está parado.

terça-feira, 15 de dezembro de 2020

QUANDO O AMADOR VIRA PROFISSIONAL (Dia do teatro amador)

             De vez em quando eu gosto de fazer referência a datas comemorativas, e são tantas que até parece impossível de se comemorá-las todas. Um sujeito chamado Nei Van Soria propôs criar o dia do ócio e sugeriu o dia cinco de outubro, que é o dia do seu aniversário, deve mesmo andar muito ocioso para propor isso!

Algumas datas poderiam ser comemoradas com mais ênfase, tipo o dia da mentira, são tantas por aí que talvez ninguém acreditasse mesmo em qualquer evento de comemoração. Inclusive, vou sugerir uma alteração para essa data que atualmente é comemorada no dia primeiro de abril, pode acreditar, seria muito mais adequado se fosse em algum dia de agosto, quando se inicia a propaganda eleitoral. Poderíamos trocar o dia dos pais pelo dia da mentira e comemorar o dia dos pais em abril, longe dessa cambada de mentirosos!

Hoje, dezesseis de dezembro, comemora-se o dia do Teatro Amador. Artistas são também uma espécie de mentirosos! Vivem da fantasia, do faz de conta, da representação, do jogo de cena e muitas vezes do sorriso inventado cobrindo a tristeza enrustida atrás de camadas de tinta ou maquiagem. Que seria da alegria não fosse o artista amador, sim o amador, aquele que faz da arte o alimento para a alma muito mais do que o alimento do bolso como o fazem os profissionais.

Curvo-me e tiro o chapéu aos artistas do semáforo! Quantas vezes parei o carro no sinal vermelho com o dia acinzentado e um malabarista trouxe um colorido por alguns segundos e aquela moeda que pus fora da janela nada significa para mim perto do que ele fez para consegui-la. Trinta segundos de apresentação e sigo o caminho, mais alegre, para parar outra vez no semáforo e vez uma venezuelana com uma placa no pescoço pedindo ajuda para comprar comida para a filha que não tem a menor ideia do que esteja acontecendo naquele canteiro central.

Quando o governo destina verbas para incentivar a cultura e entre a despesa orçamentária e o artista no palco da rua sobra algum investimento que justifique a despesa, as ruas são tomadas de alegria e o povo nem se lembra dos teatros onde a burguesia se acomoda em cadeiras individuas. A alegria genuína vem, sim do teatro amador!

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

POR UM TEMPO, FORA DA CAIXINHA



O Brasil é um país diferente mesmo! Não só pela tristeza do seu povo transformada em alegria na televisão durante o carnaval, ou pelas mulheres sofridas pela discriminação e exploração, feitas bonitas e exaltadas em versos e prosa nas rodas de samba, ou, ainda pelo futebol que convoca jogadores de países do mundo todo, menos do Brasil, para a seleção, mas pela capacidade de aceitar as mentiras públicas como verdades particulares. É um caso a ser estudado, tipo aquele desafio dos nove pontos da figura ali acima.

Fiquei uma semana sem publicar nenhuma crônica, simplesmente porque não as escrevi. Não me dei ao trabalho de escrevê-las. Morando neste país tão diferente, achei desnecessário. Mas, depois de saber que o mundo todo está completamente comprometido com a vacina contra a COVID, pensei em resolver o problema proposto por John Adair, em 1969, chamado o ‘O Desafio dos nove pontos”. Se quiser tentar, as regras são as seguintes: Ligar os nove pontos da imagem acima, usando apenas quatro linhas retas, sem levantar o lápis do papel e sem passar mais de uma vez pelo mesmo ponto. Uma única informação adicional é muito importante: É preciso pensar ‘fora da caixinha”.

E é sobre isso, exatamente sobre isso que ando pensando ultimamente, não o problema do John, mas a parte ‘fora da caixinha’. Para resolver o problema dos nove pontos é preciso que os traços ‘saiam dos limites indicados”. Enquanto eu deixava de publicar meus textos por uma semana, os preços no supermercado subiram absurdamente e o governo anunciou índice de inflação dentro dos pontos aparentes do problema, e propôs os reajustes ‘fora da caixinha’ para os salários e aposentadorias!

Fora da caixinha também é um programa onde as pessoas viajam para outros países sem ter que pagar nada pela hospedagem, se comprometendo a cuidar da casa, que é dos outros, como se fosse sua, tipo a privatização de plataformas da Petrobrás que é concedida a investidores internacionais que a ocupam e dela tiram o lucro que será remetido para países estrangeiros.

Então, por que eu, um simples escrevinhador que não defende cloroquina ficaria quieto no meu canto com as palavras pululando dentro do peito? Resolvido o desafio dos nove pontos, continuo publicando minhas mal traçadas linhas e me permito pensar que, pelo menos um pedacinho do jornal ainda pode ser um lugar fora da caixa.

sábado, 12 de dezembro de 2020

O TEMPO

Já imaginou se você

Nunca tivesse existido?

Eu seria mais feliz?

Como saber?

 

Não sei predizer o destino

Também não, ver o passado

Que seria de mim

Se não existisse você?

 

Estou enclausurado

Quisera eu ter tido notícia

Da tua heroica vida

No século das Luzes!

 

Mas o tempo é cruel!

Me proíbe a existência

Da máquina que me levaria

A tua presença em dois mil e noventa!

 

Infeliz existência!

Apago a luz da sala,

Vejo sombras por debaixo da porta.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

A GAIOLA

 De que é feita
Essa gaiola
Que prende o canto
E prende tanto...
 
O que são essas amarras
Que impedem as asas
De ver:
A liberdade?!?!
 
Por que me prende
Se nem sei porquê?
 
Não posso voar
Mas posso ver
Talvez só imaginar...
 
O limite da palavra,
O verbo e o arame.
O espaço imaginário
E o prazer. Não ter.
 
Me render?
De que é feita essa gaiola?
Ainda não sei dizer!
 
Canto meu canto
Quero voar.
 
Uma passagem
Aldrava esquecida
Posso ver o que tem lá fora.

De que é feita essa gaiola?
Já não quero mais saber!

sexta-feira, 4 de dezembro de 2020

TODO MUNDO TEM DIREITO A PELO MENOS UMA

             Quem ainda não cometeu pelo menos uma loucura de amor do tipo entrar pela janela no quarto da namorada enquanto os pais dela dormem no quarto ao lado e ter que fazer o mínimo de barulho possível e ainda assim mesmo o pai dela chamar do corredor e impacientemente forçar a porta enquanto você tem que fugir apressadamente e chegando em casa quase sem fôlego não consegue dormir com medo do dia clarear e os teus pais te proibirem de sair por uma semana e por um mês nos fim de semana até que ele se lembre das suas próprias loucuras e te libere dizendo: Tenha mais cuidado!

Por muito tempo as loucuras de amor ficaram mais ou menos restritas à juventude que ainda não tendo assumido as promessas do casamento até que a morte os separe podiam arriscar-se entre uma loucura ou outra atiçados pelos hormônios superabundantes nessa idade que precede os votos de fidelidade eterna ou a eterna infelicidade de uma vida casta.

Mas os tempos mudaram e pelo menos por enquanto já se sabe que os hormônios não são exclusividade da juventude e as leis sobre o casamento já permitem que adultos comprometidos com promessas malfeitas de amor eterno mesmo amando eternamente podem tomar o auxílio do divórcio e no novo normal sentir aquele desejo de uma loucura qualquer e encontrar a bem-amada tarde da noite para que os filhos dela não vejam e mesmo assim um rebento aparecer na porta do quarto da mãe perguntando quem está lá dentro às duas da madrugada e não adianta dizer que é voz do telefone porque desde a mais tenra idade eles já conhecem muito bem o que é uma voz que sai do telefone.

Por longo tempo seu Aldir comportou-se religiosamente fiel à sua esposa que ficara morando em outra cidade onde tinham imóveis que ela passou a cuidar dos aluguéis enquanto o marido cuidava do emprego que arrumara e do qual tirava o sustento e ainda comprara um terreno onde construíra casa para quem sabe ter a esposa consigo inda que ela recusasse a abandonar o capital que deveria ser cuidado como filho há duzentos quilômetros de distância só os deixando vez em quando para ver o marido e atender-lhe as necessidades que se não o fizer tem sempre alguém disposta a isso.

Com sobra de tempo que mente desocupada é moradia do demônio e o demônio é caprichoso nas coisas que faz mesmo fazendo tudo errado fez seu Aldir olhar nos dias do calendário e saber que estando só por muitos dias ainda talvez pudesse ver se as vizinhanças tinham algo de atrativo e tendo quem sabe qualquer loucura de amor pudesse acontecer.

E tinha uma vizinha com quatro filhos e uma fogueira eterna entre as pernas e uma escada no porão que poderia muito bem ser colocada atrás da janela do quarto para uma comunicação qualquer em noites de solidão e companhia que certamente provocaram o alvoroço dos filhos pelo desaparecimento da mãe que depois de ser procurada até pela polícia foi encontrada pelo vizinho muito antes de seu desaparecimento sequer se noticiado. Mãe, isso é uma loucura!!!

quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

QUANTAS PERGUNTAS EU FIZ ANTES QUE ELA CHORASSE



Ela estava no semáforo com uma placa pendurada no pescoço que cobria quase todo se belo corpo moreno, no rosto uma máscara de pano escondia a tristeza, mas deixava dois olhos cansados verem o tamanho do desprezo  que a sociedade cristã capitalista tem pelos estrangeiros, contrariando o próprio texto base da fé que diz em Deuteronômio 10:19: “Amai, pois, o estrangeiro, porque foste estrangeiro na terra do Egito”.

Quando o semáforo abriu, andei mais alguns metros, estacionei o meu carro e fui ter um particular com a moça da Venezuela, não porque me lembrei do texto bíblico, mas porque certamente já fui um ‘estrangeiro’ neste lugar. Na década de 1980, quando aportei por estas bandas do Mato Grosso do Sul, não havia uma única pessoa conhecida a quem pudesse recorrer. Dei-lhe a moeda e ela me ofereceu um doce, não peguei o doce, ela me ofereceu um olhar triste, tomei para mim e devolvi-lhe um sorriso acanhado e algumas perguntas.

Quantas perguntas eu fiz? Não sei. As respostas que me deu são infinitas, ainda hoje, dez dias depois, encontro respostas dela para minhas perguntas, algumas que não compreendo, outras que fico curioso por saber mais e ainda algumas que não fazem o menor sentido numa sociedade dita civilizada. Enquanto conversávamos, o sinal fechou e abriu algumas vezes, os carros paravam e arrancavam e a moça estava sempre com o pote de doces na mão e a placa implorando ajuda, pendurada no pescoço.

Ontem recebi uma mensagem do meu amigo Maurício, venezuelano também, que veio ao Brasil há uns três anos, com a esposa, em busca de uma vida melhor. Está na Venezuela por uns tempos para cuidar de sua mãe, logo voltará para Dourados onde estão a esposa e o filho. Quando chegaram à esta cidade, ficaram três dias em nossa casa. Tempo preciosíssimo.

Lembrei do Maurício quando perguntei para a moça do semáforo pelo seu nome. Ela me respondeu e eu ainda estou procurando a resposta. Me disse que se chama Mari. Era ‘a’ resposta ou era ‘uma’ resposta? Não sei. Tanto faz. Essa pergunta veio no meio de uma conversa não muito difícil do tipo: como foi que tu vieste parar aqui.

 Minha dor estava nela, eu podia sentir, dor doída, de quarenta anos. Uma história arrastada pelas estradas, marcada pelo abandono, adoecida pela rejeição, gangrenada pela miséria, guiada por uma única estrela: esperança! E sustentada por uma força, que deu lugar ao choro incontrolável quando lhe fiz a última pergunta: E os teus filhos?

terça-feira, 1 de dezembro de 2020

APOSENTANDO POR TEMPO DE MESADA

Quando escrevo uma história eu gosto de escrever os nomes verdadeiros dos personagens, alguns até imprimem o texto para mostrar orgulhosamente para os amigos ou familiares o seu nome no jornal. Mas, às vezes não consigo tal autorização, em alguns casos nem consigo saber o nome verdadeiro ou se me é dado um nome que pode ou não ser só um apelido, talvez um nome inventado na hora. Para a história que fui autorizado a publicar hoje, também fui completamente desautorizado a usar nome, apelido ou qualquer menção que levasse a identificação da pessoa, então vou usar nome completamente fictício.

Me disse o camarada, que passo a chamar de Seu Joaquim, que depois de quarenta e oito anos de trabalho conseguir finalmente aposentar-se. Foi sempre muito difícil, pois um pedreiro só ganha bem depois de muitos anos na profissão e se conseguisse permanecer na mesma firma, como é o caso.

Seu Joaquim tem dois filhos crescidos e sempre quis dar o melhor para os meninos. Quando nasceram fez uma promessa de eles não sofreriam como o pai e jurou que jamais faria ele trabalharem em serviço pesado. É muito sofrido e não quero isso para meus filhos! A esposa concordava, como toda mãe, de que os filhos nunca, mas nunca mesmo, tivessem que trabalhar duro como o pai.

Logo que completaram os anos de ir para a escola, cada um foi matriculado na escola municipal onde estudaram até a oitava série, depois na escola estadual até o segundo grau e daí foram alguns longos anos tentando passar no vestibular até que por fim desistiram dessa ideia. O pai insistia que fazer faculdade era importante, mas depois dos vinte e cinco anos de idade, pensou que deveriam achar emprego e começar a vida. Como, pai? Não vou trabalhar de pedreiro, não! Além do mais, o tempo de aposentadoria já está contando!

Sim, Seu Joaquim fora um pai atencioso. Desde que cada um dos dois meninos completou dezesseis anos, passou a pagar INSS para eles, como se fossem autônomos, assim, pensava, quando completarem cinquenta e um anos de idade já poderiam se aposentar. E parecia que os meninos iam mesmo aposentar sem trabalhar. Agora, diziam isso é comum; Nem, Nem, Nem: Nem estudar, Nem trabalhar, Nem ajudar em casa.

E dá para acrescentar mais um Nem: Nem é fácil ter filhos assim! Mas faltava só mais quatro anos para chegarem ao tempo de se aposentar e quem sabe saírem de casa. Bolsonarista de carteirinha, acreditava que agora tudo ia ser diferente, e foi, veio a reforma da previdência e a idade dos meninos aposentar foi para sessenta e cinco anos. Desgraçado! Não aguento mais pagar mesada! 

ESQUERDOPATA!

  Ontem eu estava fazendo minha caminhada vespertina pela praça do Parque Alvorada e ouvi uns amigos que caminhavam e conversavam animadamen...