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quinta-feira, 17 de dezembro de 2020

EU NÃO GOSTAVA DO NICANOR

Como eu poderia gostar do cara que andava num Chevete antigo escutando música clássica e falando que no comunismo era assim, música de qualidade para o povo que se tornará culto! Aquela carona que você me deu na frente do Jornal O Progresso, onde tu trabalhavas e me levaste até minha casa foi certamente a carona mais esquisita que já peguei. Eu escrevia poesias e andava de bicicleta e dava aulas de matemática, mas tu já eras jornalista e estavas escrevendo um livro! Como eu poderia gostar?

Agora me vem tu com essa de morrer infartado! Primeiro deverias me explicar porque publicaste só a metade do meu artigo na revista Arandu. Aquela história de que era muito grande não colou. A revista era quase um livro e o meu artigo não passava de dez páginas! Nunca mais escrevi nada para ti, mesmo você prometendo deixar o espaço que eu quisesse na próxima edição. Mesmo assim, devo reconhecer que tua revista foi um sucesso!

Me perdoem os leitores desta crônica, mas meu amigo morreu hoje (ontem, no caso) e eu estou aqui lembrando de quando o Nicanor tomou de empreitada a fundação da Academia Douradense de Letras e me disse que queria que eu lançasse logo meu livro para entrar na academia e eu teimei em não faze-lo que não o faria só para isso, que um livro é como um filho e ninguém faz um filho só para poder se casar com a mãe dele. Desculpa aí Nicanor, agora já lancei dois livros e o terceiro está pronto e o quarto pela metade e eu ainda não sou acadêmico, mas tenho grandes amigos lá e a academia até já fez festa de confraternização na minha casa e tu não foste.

Eu li e reli teu livro de poesias, Vida Cachoeirinha, que está bem aqui do meu lado e faz muito sentido para mim porque conheci o miserê daquele bairro e fui medir terrenos com vinte centímetros de lama na ocupação do União Douradense que fica bem ao lado e se parece muito. Tem vida no Cachoerinha e tem um processo revolucionário no União Douradense. Nós queríamos fazer a revolução na época do PCB, lembra? Ah, não! Agora já não podes mais lembrar...

E o meu livro que tu falaste que ias publicar e nunca publicaste? Tenho a foto de quando nos reunimos para tratar da edição e até combinamos a data do lançamento. Nunca aconteceu! Eu fiquei bravo, mas tu continuaste sendo meu amigo no face e até continuaste a mandar mensagens pelo WhatsApp. Brigaste comigo na feira porque lancei o livro por outro editor. Agora não vai mais dar!

Só mais uma coisinha, meu caro Nicanor: Se tu continuares a publicar a revista Arandu, aí para onde estais indo, deixa um espaço reservado que quando eu também for, prometo que vou escrever o artigo, mas só se você prometer que vais publicá-lo na íntegra! Vai em paz, me caro!

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