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quinta-feira, 19 de novembro de 2020

OS PREÇOS ESTÃO PELA HORA DA MORTE!

             Foi botar o pé dentro do supermercado e me veio Dona Márcia, uma senhora conhecida de há muito quando ainda existia o Partido Comunista Brasileiro e nós éramos militantes aguerridos, crentes de que fazendo a revolução resolveríamos todos os problemas sociais e viveríamos num país justo, aliás, mais do que um país, viveríamos num mundo de justiça social e paz permanente, pois a revolução é uma causa internacional e comunismo só será viável se implantado no mundo todo.

Aproximou-se com passos confiantes, tomou-me pelo braço e me arrastou para longe dos caixas, pôs as duas sacolas no chão e só então me cumprimentou, como antigamente, chamando-me de camarada e exaltando os trabalhadores que ainda farão a tomada do poder neste país. Qualquer um, disse confiante, qualquer um que fizer compras hoje neste supermercado será um revolucionário em potencial! É preciso ver, camarada! É uma revolta total aí dentro, não há um que esteja satisfeito com os preços, nem mesmo os funcionários, que aliás, nunca foram funcionários, são trabalhadores insatisfeitos com o sistema!

Eu ainda não estava entre os ‘nenhum que estavam insatisfeitos’, com o dinheiro contado, fui às compras. Passei no caixa e paguei aproximadamente o valor que tencionara gastar e saí do supermercado com um pouco mais do a metade das compras que planejei levar para casa. É, os preços estão pela hora da morte!

Dá uma ajuda, moço! Sim, ainda mais se me chamar de moço! Descontei mais alguns produtos das minhas sacolas e segui até o carro levando junto comigo os tempos de mocidade. Há quase quarenta anos, quando era mesmo moço, os ideais revolucionários sangravam nas veias abertas da América Latina e os indígenas andavam pelas ruas pedindo uma ajuda, quase sempre um pão velho nas portas das casas.

Guardei o que me sobrou de compras no carro, bati a porta fui para o lado do motorista, mas não entrei, as mãos não queriam abrir a porta, então as coloquei sobre o capô e fiquei olhando ao redor, só então percebi o que a camarada insistia em me dizer. O estacionamento estava abarrotado de carros relativamente novos e as pessoas dos carros estavam envelhecidas em reclamações dos preços do supermercado. Reconheci uma voz ao longe que, acompanhada de gestos largos dizia: Camarada, é disso que nos alimentamos!

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