Não sou daqueles que fica escutando conversas dos outros para fazer fofoca, nada disso, mas tem hora que a conversa se dá de tal forma que é quase impossível não dar atenção e torna-la pública, com o devido cuidado para não criar qualquer embaraço. Veja o curioso diálogo que presenciei entre dois homens, esta semana no calçadão enquanto as suas esposas faziam compras nas barracas de artesanato.
Estou pensando tirar umas férias. Férias? É, quando a gente para
de fazer o que está fazendo por trinta dias é férias, não é? Mas, me diga por
que tu estás querendo tirar férias justo agora que estamos no meio dessa
pandemia? Se eu tirar férias quando a pandemia acabar, não vai todo mundo
querer tirar férias também? Sim, mas quando todo mundo tirar férias fica mais
animado, não fica? Fica, mas daí será que os preços não vão ficar tudo mais
caro?
Quando ouvi seis perguntas seguidas para uma única resposta que
foi dada antes mesmo da primeira pergunta, fiquei me perguntando, com perdão do
trocadilho, se tanta pergunta poderia ser um diálogo que apresentasse alguma
resposta. Não deu tempo de ficar pensando, pois a mútua interrogação continuou
e eu não podia perder o fio do questionário.
Me diga: De que é que tu trabalhas? Eu? Te perguntei, não
perguntei? Sim, mas tu és fiscal do trabalho? Não, tu disseste que irias tirar
férias, não disseste? Disse, sim, não disse? Não queres me responder? Isso é do
teu interesse? Pois vou dizer de mim para ver se facilita esse diálogo, sabias
que estou aposentado? Então não estás mais trabalhando? Que achas? Não
trabalhas e queres saber se trabalho?
Doze perguntas para nenhuma resposta chega a ser irritante.
Fiquei ouvindo por puro dever de ofício. Notei que cada vez que um dos
inquiridores pensava estar em vantagem demonstrava-o elevando o corpo ante a
próxima interrogação e fazia gestos expansivos e então se sentava outra vez à
espera do seu oponente inquiridor que procedia da mesma maneira.
Tu não achas perigoso tirar férias agora que a doença está se
espalhando? Você sabe onde acontece o maior índice de contaminação? Onde tem
aglomeração, não é? E onde é que o trabalhador se aglomera? No transporte
coletivo? Então, se eu tirar férias, não vai ser menos perigoso? Bom, tenho que
concordar, mas tu vais viajar? Não vais?
Mais oito perguntas, e eu me peguei contando cada uma delas como
se contasse os carros que passam pela rua. Confesso que esse interrogatório de
respostas perguntadas não ajudou a entender as afirmações que poderiam estar
subentendidas, então resolvi perguntar o porquê de tantas perguntas e nenhuma
resposta e a resposta veio em uníssono: E tem alguém que dá respostas neste
país? Você já viu o governo dar alguma resposta para o povo?
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