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sexta-feira, 23 de outubro de 2020

AGORA ELES NÃO PRECISAM MAIS DE MIM!

Enquanto empurrava meu carrinho, distraidamente pelos corredores do supermercado e ia colocando alguns produtos dentro dele, inclusive um pacote de arroz, apesar do preço totalmente inovador, e já ia em direção ao caixa preferencial para idosos, ouvi aquela voz que me conhecia perguntando pelo meu bem estar e arrastando um sorriso, forçado? era aquele sorriso que as pessoas tem quando estão em público e encontram pessoas conhecidas, como se fosse obrigatório estar feliz nessas ocasiões. Oi, tudo bem?

(Não, não está tudo bem!) Claro, tudo bem, e você? Considerei que seria uma total indelicadeza falar a verdade para quem claramente mentia com a boca, mas deixava a verdade expressa nos olhos com o indefectível testemunho das olheiras. Talvez estivesse precisando de um ombro amigo, estão tomei sua cesta de compras e passei junto com as minhas para facilitar, e do outro lado do caixa a convidei para um refrigerante no Subway, que no Brasil não é metrô mas uma lanchonete num lugar qualquer, esta que fomos era dentro do supermercado mesmo.

Minha amiga sentou-se do outro lado da mesa, em minha frente. Observei-a enquanto ela ajeitava as sacolas de compras na cadeira vazia de um lado e do outro, gastou um longo minuto olhando tristemente para as sacolas, ergueu a cabeça e disfarçou um sorriso mentiroso e me perguntou como estava a vida de aposentado. Não tenho do que reclamar! É, ela disse, você se aposentou na hora certa, agora está difícil, parece que ninguém mais vai aposentar!

A lanchonete estava quase vazia. E o nome subway era nome próprio, mais próprio do que o de batismo. Minha amiga parecia estar num metrô, num buraco sem fim embaixo da terra, numa direção sem escolha sobre os únicos trilhos disponíveis, olhando o nada à frente e deixando lágrimas sobre a mão que apoiava o queixo. A tristeza tinha que ser muita para uma mulher de meia idade se permitir ao choro em público diante de um amigo esporádico. Chamei o Garção e pedi água. Um longo silêncio que não constava no cardápio foi servido à mesa, daí veio a água mineral sem gás, só então as palavras para traduzir a linguagem do silêncio e da tristeza: Agora eles não precisam mais de mim!

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