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sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

O DIA DO AMANHÃ


Hoje nem é direito ainda e eu fico pensando se amanhã vai ser melhor, porque ontem nem deveria ter existido. Me lembrei a noite inteirinha que Deus me deu da meia noite do ano novo quando todos estavam lá na festa olhando para os fogos que brilhavam bonito no céu refulgindo em cores de prisma, não aquele carro da Chevrolet, mas o sólido de seção triangular que tem a propriedade de decompor a luz branca no espectro de cores. Não tinha um sólido de cristal no céu, só as luzes coloridas enchendo os olhos de brilho e o coração de esperança: Feliz ano novo! E os abraços de solidariedade. O rosto derretido em sorrisos sem fim. Fartura de comida e conversa como se todo mundo fosse gentil.

Fevereiro já vai terminando o terço dos dias e eu estou aqui, acordando o dia de uma noite sem dormir, lembrando da alegria. Abri dez vezes o face book, dez vez fechei. Só tinha gente alegre e vitoriosa para me fazer inveja e uns raivosos para aumentar a meinha tristeza. Eu devo ser o único no mundo que só quer o bem, mas vive sem ninguém! Se o ano novo fosse amanhã eu aguentava mais um dia, nem que fosse do jeito de hoje.

Agora que o dia já é, deu de me dar o sono, atrasado igual que nem o salário que o patrão só paga depois do dia quinze e ainda desconta um tanto de coisa que no fim mal dá para pagar o fiado do mercadinho. Aí começo a contar os dias para saber quando vou poder comprar fiado de novo. Só que ontem acabou o prazo desse mês e falta de um tudo aqui em casa! Benção esse meu vizinho que não desliga o wi-fi da internet nunca.

E eu que nunca perdia a esperança, esperava que agora o salário ia aumentar, mas o home fez foi diminuir um pouco até do pouco que já ia ser. Já falei para o dono do mercadinho, se os preços continuar aumentando eu vou fazer greve de fome e aí ele vai ver!

 

Elairton Paulo Gehlen

terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

ENQUANTO A CHUVA NÃO VEM


Sei que o tempo
Tem um tempo
Que não é meu.


Por mais que eu faça
O tempo só passa
E eu vivo como Bartimeu.


Faço a minha parte
Trabalho com arte
Mas o futuro é um breu.


Sulquei a terra
Corrigi os erros
Desvendei segredos
Obedeci como fariseu.


Tenho a semente
Tenho tudo em mente
Estou disposto e contente
Estou no apogeu.


Mas a terra é seca
Não há acordo nem treta
A indiferença é certa
Até agora não choveu!
Elairton Paulo Gehlen

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019

O MAR DE BRUMADINHO

   


Hoje eu não tenho uma história para contar. A história que eu tinha acabou, assim num de repente daqueles que vem sem nenhuma explicação e vai findando quase de um tudo como se um tudo fosse mesmo um quase nada! E o dia ainda estava no meio do dia e esse lugar que é belo, Belo Horizonte, ia ganhando mais um almoço na mina do feijão.

As riquezas continuam ricas, os ricos, ricos e os minérios ainda fazem os ricos ricos. Eu anotava o último almoço no meu diário quando pedi feijão. A mina do feijão jogou molho no meu prato. Achei um desacato, veio mais do que eu pedi, levou meu prato, a mesa, os amigos, e eu. E eu! Comi o molho da mina do feijão até minha alma separar do corpo, enlameado, perdido para nunca mais ser achado, para nunca mais ser lembrado, só mais um número, até agora acharam noventa e seis!

Não sei vocês, mas eu só vejo meus colegas de trabalho da mina, mina do feijão. Mortos, isso: mortos! Acharam noventa e seis, mas eu não estou nessa conta. Me encontro no rio, no meio da poluição, contaminando tudo, já passei pela cidade, destruí casas e ruas, destruí praças e matei mais gente inocente. Saí da cidade e destruí lavouras e fazendas, sítios e gado. Fui eu! Eu meus amigos e tudo que vinha junto com a lama da barragem malfeita da mina, mina do feijão.

Minha alma voa para longe! Tem promessa de Salvação. Tem uma revoada de almas sobre Brumadinho, mais que noventa e seis. Dá para ver os helicópteros sobrevoando o mar de lama, só uma alma pode ver o tanto de lama que tem dentro do helicóptero, é outro mar, mas de lama, não é lama da barragem da mina do feijão, é lama que vem do inferno e tem cheiro de enxofre! É onde está o seu coração.

 

Elairton Paulo Gehlen

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

EU SEI A DOR


Eu sinto a dor
O espinho da carne
Dói no corpo
Dói na alma!


É dor de amor,
Amor sofredor
Amor que arde
Que morre, que parte.


Palavra incontida
Gesto banal
As marcas da vida,
Herança fatal!


A palavra que é dita,
O gesto brutal
A ira incontida
O abandono moral.


É flecha lançada
Que produz o seu mal
Fere a alma e o corpo
Incomoda sem igual.


A palavra lançada
Não volta vazia
Enche o espírito
De dor ou alegria.


Quem sofre sabe
O que o outro não vê,
Ás vezes sofre
Sem mesmo entender.


Eu sei, porque dói também
É dor sem fim.
Só quem sente essa dor,
Sabe a dor que está em mim.







 Elairton Paulo Gehlen

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

ROUPA BRANCA



O ano começou como outro qualquer, com festança e fogos de artifício alimentando a ideia de que esse será mesmo o melhor ano da sua vida. Família reunida e cantando junto com a música: este ano será de paz no coração. Paz exteriorizada pelas roupas brancas e abraços fraternos entre os familiares. Meu vizinho, o José, dá para acreditar que ele fica em casa sozinho na noite de ano novo? Ele tem que mudar isso! José gostava de ficar sozinho, assistindo televisão, sempre tem filme bacana falando do ano novo.

         Janeiro conta seus dias e ela meio que se esquecera das roupas brancas. Você viu as promoções que estão fazendo agora? Deviam ter feito antes do natal para a gente poder comprar os presentes mais baratos. Mas não. Exploram até o último centavo, esses gananciosos, e quando ninguém mais está interessado, eles fazem ofertas para dizer que são bonzinhos.

         Seus familiares não aparecerem mais, mas os do José! Todos dias vem no fim da tarde para tomar tereré. Sentam na frente da casa, na sombra do pé de manga e ali ficam até escurecer. É irritante ver eles rindo sem motivo!

Anoitecia e nem a lua cheia, esplendorosa, fora capaz de trazer alegria. O dia fora de sol quente. Não sei como a gente ainda suporta esse calor! Também, derrubam todas as árvores, deviam plantar outras no lugar. Nuvens encobriram a lua e um vento anunciando chuva veio do Sul, acompanhado de relâmpagos e trovões. Agora vem essa chuva! Não dá nem para fiar aqui na varanda, só falta cair raio e queimar os eletrodomésticos. A chuva veio e a paz que já não estava ali foi levada para bem longe com a força do vento que derrubou as roupas do varal e fez bater com violência a porta do corredor.

         O sol fez um novo dia amanhecer, fez também a temperatura subir. Um espinheiro com flores brancas insistia em atravessar a tela numa luta inglória para adentrar ao jardim. Ao fim de alguns dias de luta, jogou suas sementes para o outro lado, fecundando a terra e gerando vários filhos. Ah, não. Era só o que faltava, agora temos espinhos no jardim!

         Irritada, foi para a sala ver televisão. As notícias davam conta de que sua aposentadoria ia mesmo perder poder de compra, já que a correção fora inferior à de outros índices da economia. Que droga, ela disse, parece que a paz só existe no dia do ano novo! E eu usei roupa branca para o que?

 

Elairton Paulo Gehlen

terça-feira, 22 de janeiro de 2019

O AMOR NÃO ACABOU


O amor não acabou,
Porque se eu olho para mim
Vendo o que sobrou,
Desde o começo, vejo só o fim.

O amor não acabou.
Talvez foi só uma ilusão,
Que no peito se acomodou
Enganoso foi o coração.

O amor não acabou.
Faltou uma identidade,
Porque onde mora o amor
Existe cumplicidade

O amor não acabou.
Benigno, não busca seus interesses
Não é invejoso, não se ensoberbece
Não se irrita, não arde em ciúmes.

O amor não acabou,
Não foi assim que eu vivi.
O amor não acabou
Porque ele nunca existiu!





Elairton Paulo Gehlen

sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

DOCE VENTURA


Estava pronto para soltar uma gargalhada quando viu dois olhos castanho-escuros muito próximo dos seus. A gargalhada nem se fez, mas o olhar que amiúde era expansivo procurando gente no farfalhar da festa, colou naqueles olhos castanho-escuros que se aproximavam levando consigo o rosto de pele lisa e clara, sobrancelha desenhada, cabelos loiros levemente erguidos pelo vento.

Nenhuma palavra, enquanto a mão esquerda tocava com os dedos médio e anelar suavemente a nuca, o dedo indicador e o polegar pegavam levemente na ponta da orelha. Logo sentiu o ar aquecido da respiração e a boca foi tomada por um beijo. Não tinha gosto de mel, tinha gosto de beijo. Fechou os olhos e ficou embebecido pelo beijo. O beijo entrou pela corrente sanguínea tomou conta da respiração, do sistema nervoso, assumiu o controle do cérebro e nada mais havia além desse beijo.

Aos poucos foi percebendo que não havia mais chão, suavemente iam subindo às alturas aproximando-se das nuvens. Atravessaram-na e saíram molhados para em seguida secarem pelo calor do beijo. Olhos fechados e o mundo girando lentamente ao redor. Flutuando, girando como se rolassem sobre as nuvens, às vezes pareciam estar de ponta-cabeça. E o mundo continua girando lentamente. Aí se soltam e cada um começa a dar cambalhotas para traz, para os lados, para frente. É incrível como um beijo pode anular a força da gravidade! Anula também a força do preconceito, da timidez, E o mundo que era exterior, agora está dentro dele.

De mãos dadas vão andando um pouco acima das nuvens até sua borda, então olham para baixo, o mundo iluminado está lá. Não dá para ver conflitos, nem confusão, nem trânsito. Só luzes, como estrelas. Um céu estrelado em cima, outro céu estrelado embaixo. Deram impulso e voaram como dois pássaros que flutuam na corrente de ar quente. Então ficaram de pé no meio do vácuo infinito e se beijaram. Aos poucos, como que vindo de muito longe, ouviu uma voz que o chamava: João! João! A voz foi se tornando audível e ele abriu os olhos, assustado. Que foi, João? Você está bem? Estou, respondeu. Estou tão bem como nunca poderia imaginar que algum dia pudesse estar! Eu te amo!

 

Elairton Paulo Gehlen

terça-feira, 15 de janeiro de 2019

POESIA: O TEMPO


É pouco o tempo,
Frágil o pensamento,
Dócil o encantamento,
Lúgubre o desvanecer.


Insólito o comportamento,
Solícito o amor,
Insuportável a dor,
Inenarrável o sentimento.


Indescritível o abandono,
Inexprimível o gemido,
Descritível a solidão,
Contável o tempo perdido.


O silêncio é longo,
O tempo é curto,
O comportamento...
O abandono...


Nada mais eu sei.
O pensamento é torpe,
O amor exigente,
O gemido é de dor.


Vejo o infinito,
Nele o encantamento.
A eterna solidão
E a dor que rói por dentro.


Quando tudo se acalma
Desvanece a alma
Sinto que é o fim
De um tempo que se perdeu em mim!

Elairton Paulo Gehlen






sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

RESILIÊNCIA


Palavra bonita de se escutar!, esse ‘zil’, ‘resil’ soa como música, parece um pouco ... não, não parece. Que foi compadre? É que eu ia dizer que parece ... deixa para lá. O quê compadre? Essa palavra eu nem sei o que significa! Meu filho que me falou ela ontem, e depois que ele me falou eu nem consegui dormir, só pensando.

Parece residência. Residência, compadre? É, tem residência que é tão grande que dá para uma favela inteira morar dentro dela. E tem favela inteira que não tem residência para morar! É compadre... .

Também parece resistência! Não, isso não é, se não a ministra, aquela do azul e rosa, ia proibir de se ensinar nas escolas. Verdade! Resiliência... zil, resil... Estou querendo dizer, mas acho que não vou, não. Diga logo compadre, você é muito teimoso!

Isso, foi de teimoso que eu aprendi que apanhando a gente segue o caminho que traçou. Cada pancada que levei fez eu endireitar o caminho e permanecer no meu trajeto. Endireitar, compadre, mas você não era de esquerda? Endireitar para ficar na esquerda, só que mais entendido que antes, entendeu?

Mas essa vida tem problemas demais para a gente continuar no mesmo trajeto! Problemas, compadre, é essa coisa que fica entre o que nós somos realmente e o que gostaríamos de ser, é essa tensão. É isso que é a substância da vida! Que que isso tem a ver com resiliência? Sei lá compadre, eu não sei o que que é essa tal de resiliência, mas eu sei que empatia é quando a gente se coloca no lugar da outra pessoa e vê os problemas que ela tem.

E o que que isso tem a ... deixa para lá! Se tem problema, tem que ter tenacidade, que é para remoer os contratempos e as desilusões e até as injustiças para alcançar o objetivo. Entendeu? Endireitar o caminho para continuar na esquerda!

Oi pai, tão falando de que? Resiliência, meu filho. Ah, então o senhor foi pesquisar e agora sabe o que é! Não filho, não sei e o compadre também não sabe. Está bom, vou explicar então: “Resiliência é uma palavra que junta dois termos do latim: o verbo silie (saltar) e o prefixo re (novamente) sendo entendido atualmente como saltar de volta ao estado normal”. Ah, então é isso, mas não entendi. Eu também não.

Tá, vou explicar de outro jeito: “Resiliência significa voltar ao estado normal, resiliência é a capacidade de voltar ao seu estado natural, geralmente após alguma situação ruim e fora do comum”. Agora entendi, é endireitar o caminho para continuar na esquerda!

Mas compadre, que que você ia falar que parece... Ah, é bonito o som: zil, resil. Eu ia dizer que parece Brasil! Não é não, compadre, não é mesmo!

 

Elairton Paulo Gehlen

terça-feira, 8 de janeiro de 2019

FOTOGRAFIA


Que será que faz
Essa mão na cabeça.
Segura os pensamentos?
Acolhe sentimentos?
Ou é para que não se esqueça!

É capaz de beijar o mundo
Com essa boca vermelha!
O batom que encobre um sorriso
Meio maroto, meio indeciso,
Com tudo, parece, se assemelha.

O olhar que não vejo,
Muito bem protegido.
Será que também esconde algum desejo?
Alcançar o céu, ver estrelas, um gracejo?

O cabelo pende de um lado para o ombro
Em ondas, feito praia de mar!
Deslizando em ondas sinuosas,
Como um jeito estranho de amar.

A pele é tão lisa e macia
Que tenho receio de tocar.
Parece tão frágil e tão dócil,
Que tudo o que quero é poder te amar!
 

Elairton Paulo Gehlen

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

ESTRANGEIRISMOS


Okay, eu não concordo com a utilização de palavras estrangeiras como se fossem parte do nosso vocabulário! Ontem mesmo estava me arrumando para sair, tomei meu banho e usei um novo shampoo, esqueci do condicionador e meus cabelos ficaram espetados. Ainda bem que o show era de rock e depois veio o povo do funk. Aí fiquei cool!

Em casa, cansado e com fome, liguei meu PC, fiz um pedido de pizza pela internet. Tirei minha calça jeans, vesti um short e fui para a cozinha. Preparei um cappuccino, aí pensei: melhor um drink. Tomei um whisky, liguei a TV e procurei por um programa de variedades, estava passando humor com uma drag queen, uma verdadeira sex-appeal.  Não gostei, tentador demais para quem está sozinho! Mudei o canal e assisti dez minutos de um nada cheio de gestos ensaiados, sorrisos Colgate e muito clichê de uma apresentadora pop star.

O telefone tocou e meu amigo me disse que perdi o melhor happy hour do mundo. O chopp estava trinta por cento off e ainda teve meia hora free no self service, enquanto curtiram uma belíssima performance da dançarina da casa. Fiquei com o coração partido. Além de ficar só e ouvir muito remake, o funk para mim é Trash. No pub, poderia ter aproveitado um happu hour agradável com boas companhias e quem sabe um happy end no meu studio, curtindo a night vendo um filme de cow boy e ouvindo roling stones.

Taí o meu protesto. Estrangeirismos são unusual em meus textos.

 

Elairton Paulo Gehlen

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

POESIA: ANO NOVO


Todo mundo gosta
De celebrar o ano novo,
Fechando o ano velho
Já pensando na Páscoa e no ovo!


Mas no meio
Tem o carnaval
Que vem por primeiro
E desperta o instinto animal.


Em março vai se comemorar
Um dia de bem-me-quer,
Que é para se lembrar,
Quão especial é a mulher!


Passando a Páscoa,
Que será em abril,
Maio tem dia das mães,
Especial como nunca se viu.


Junho, ah, em junho!
O mundo fica parado.
Porque nesse mês, tem
O dia dos namorados.


Julho tem férias,
Agosto dia dos pais,
Setembro semana da Pátria
Para cantar o hino nacional.


Outubro tem dia das crianças,
Que é para a gente se lembrar
Dessa vida que se renova
E que sempre podemos amar!


Novembro tem dia dos finados
Dezembro tem o natal
Assim acaba o ano
E temos um novo final!




Elairton Paulo Gehlen













QUANTO É MESMO ETERNAMENTE?

  Num sábado à noite não sei como mensurar o quanto é eternamente, o próprio sábado já me parece eterno, então, se somo a esse eterno a an...