Hoje eu não tenho uma história para contar. A história que eu
tinha acabou, assim num de repente daqueles que vem sem nenhuma explicação e
vai findando quase de um tudo como se um tudo fosse mesmo um quase nada! E o
dia ainda estava no meio do dia e esse lugar que é belo, Belo Horizonte, ia
ganhando mais um almoço na mina do feijão.
As riquezas continuam ricas, os ricos, ricos e os minérios ainda
fazem os ricos ricos. Eu anotava o último almoço no meu diário quando pedi
feijão. A mina do feijão jogou molho no meu prato. Achei um desacato, veio mais
do que eu pedi, levou meu prato, a mesa, os amigos, e eu. E eu! Comi o molho da
mina do feijão até minha alma separar do corpo, enlameado, perdido para nunca
mais ser achado, para nunca mais ser lembrado, só mais um número, até agora
acharam noventa e seis!
Não sei vocês, mas eu só vejo meus colegas de trabalho da mina,
mina do feijão. Mortos, isso: mortos! Acharam noventa e seis, mas eu não estou
nessa conta. Me encontro no rio, no meio da poluição, contaminando tudo, já
passei pela cidade, destruí casas e ruas, destruí praças e matei mais gente
inocente. Saí da cidade e destruí lavouras e fazendas, sítios e gado. Fui eu!
Eu meus amigos e tudo que vinha junto com a lama da barragem malfeita da mina,
mina do feijão.
Minha alma voa para longe! Tem promessa de Salvação. Tem uma
revoada de almas sobre Brumadinho, mais que noventa e seis. Dá para ver os helicópteros
sobrevoando o mar de lama, só uma alma pode ver o tanto de lama que tem dentro
do helicóptero, é outro mar, mas de lama, não é lama da barragem da mina do
feijão, é lama que vem do inferno e tem cheiro de enxofre! É onde está o seu
coração.
Elairton Paulo Gehlen
a minha alma te espera, como um vento que foi,
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