Estava pronto para soltar uma gargalhada quando viu dois olhos
castanho-escuros muito próximo dos seus. A gargalhada nem se fez, mas o olhar
que amiúde era expansivo procurando gente no farfalhar da festa, colou naqueles
olhos castanho-escuros que se aproximavam levando consigo o rosto de pele lisa e
clara, sobrancelha desenhada, cabelos loiros levemente erguidos pelo vento.
Nenhuma palavra, enquanto a mão esquerda tocava com os dedos
médio e anelar suavemente a nuca, o dedo indicador e o polegar pegavam
levemente na ponta da orelha. Logo sentiu o ar aquecido da respiração e a boca
foi tomada por um beijo. Não tinha gosto de mel, tinha gosto de beijo. Fechou
os olhos e ficou embebecido pelo beijo. O beijo entrou pela corrente sanguínea
tomou conta da respiração, do sistema nervoso, assumiu o controle do cérebro e
nada mais havia além desse beijo.
Aos poucos foi percebendo que não havia mais chão, suavemente
iam subindo às alturas aproximando-se das nuvens. Atravessaram-na e saíram
molhados para em seguida secarem pelo calor do beijo. Olhos fechados e o mundo
girando lentamente ao redor. Flutuando, girando como se rolassem sobre as
nuvens, às vezes pareciam estar de ponta-cabeça. E o mundo continua girando
lentamente. Aí se soltam e cada um começa a dar cambalhotas para traz, para
os lados, para frente. É incrível como um beijo pode anular a força da
gravidade! Anula também a força do preconceito, da timidez, E o mundo que era
exterior, agora está dentro dele.
De mãos dadas vão andando um pouco acima das nuvens até sua
borda, então olham para baixo, o mundo iluminado está lá. Não dá para ver
conflitos, nem confusão, nem trânsito. Só luzes, como estrelas. Um céu
estrelado em cima, outro céu estrelado embaixo. Deram impulso e voaram como
dois pássaros que flutuam na corrente de ar quente. Então ficaram de pé no meio
do vácuo infinito e se beijaram. Aos poucos, como que vindo de muito longe,
ouviu uma voz que o chamava: João! João! A voz foi se tornando audível e ele
abriu os olhos, assustado. Que foi, João? Você está bem? Estou, respondeu.
Estou tão bem como nunca poderia imaginar que algum dia pudesse estar! Eu te
amo!
Elairton Paulo Gehlen
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