Eu tinha uns óculos muito grandes, grandes mesmo, desproporcionais, que comprei na Ótica Precisão, a vendedora até que tentou, disfarçadamente, me dizer que eles eram ‘grandes’. Se alguém quer que eu mude de ideia tem que ser muito específico, tipo: ‘Olha, esses óculos são muito grandes para você, não fica bem, são desproporcionais, as pessoas vão fazer chacota!’ Aí sim. Se disser que vão fazer chacota, aí eu mudo de ideia, às vezes... Não mudei, ela, a vendedora, também não disse isso de que as pessoas fariam chacota. Comprei os óculos e fiquei apaixonado pela vendedora, ela era meio que como meus óculos, não grande, só diferente. Uma hora mais tarde e a loja tinha fechado e eu passei pelo ponto de ônibus e ela estava lá, esperando pelo coletivo e eu passei com meus óculos grandes e olhei para ela... sim, ela parecia um pouco com meus óculos grandes com seus cabelos crespos, o corpo magro, as roupas quase na moda e o olhar... ah! o olhar estava tão triste que quase ofereci meus óculos grandes para que ela pudesse encobrir tudo que já tivera visto e, olhando para mim, com aqueles óculos grandes, talvez encontrasse os meus melhores desejos... Ela estava no ponto de ônibus, acho que me viu, acho que ia perguntar se eu queria mais alguma coisa desajeitada...., um ônibus qualquer passou e levou a vendedora desajeitada para algum lugar triste.
Algum tempo depois, fui aconselhado
por um amigo a comprar uns óculos menores, e ele me mostrou os dele, aí, só aí,
me dei conta que meus óculos eram realmente muito grandes, troquei por outros
menores, encontrei a vendedora e ela não era mais vendedora de óculos e também
deixara seus ‘óculos grandes’ para trás, o marido lhe era motivo de chacota.
Passei por ela e ofereci carona ao meu objeto de desejo. Já não precisava de
óculos, estávamos tão próximos que podíamos nos ver a olho nu! Nus, fizemos
nossa relação sexual tão desajeitada que se fosse em público seríamos,
certamente, motivo de chacota! Nossos óculos ainda eram grandes demais. Acho
que fiz uma boa escolha quando troquei meus óculos, os grandes deixam muito
espaço e vemos coisas demais, também pessoas demais. Se tivesse parado naquele
ponto de ônibus e aceitado alguma coisa desajeitada, talvez ela aceitasse
trocar logos os meus óculos e ficar comigo para uma vida toda a olho nu.
Decididamente não sabemos fazer escolhas e, quando as fazemos é tarde demais
para serem boas.
Agora, quase não me lembro mais
daqueles óculos. A vendedora, quem era ela mesmo?
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