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sexta-feira, 11 de outubro de 2024

DE CONCHINHA

 



Eram cinco horas da manhã e o dia mal dava sinal que clareava pelas frestas da veneziana que protegia o quarto de amanhecer junto com o dia. Joana mexeu levemente o rosto, mas não abriu os olhos, não queria abrir, queria continuar dormindo, acordara de um sonho e queria continuar sonhando, era um sonho bom. Como qualquer sonho, esse também se parecia com um filme que estamos assistindo, mas do qual também somos atores em cena. Joana estava numa festa, dançando e bebendo, a música começou a tocar lenta e um homem que já a observava, veio dançar com ela, ele era lindo, falava coisas agradáveis e, do nada, lhe beijou na boca. Delícia de beijo!! De repente estava em casa e o cara da dança lhe falava coisas familiares, era o mesmo cara da festa, mas era o seu marido, e lhe dava flores e ela o beijou como mesmo beijo da festa e, então fizeram sua festinha particular, beberam cerveja e estavam alegres, andavam para o quarto deixando peças de roupa pelo corredor. Quando ela acordou e tomou consciência de estava mesmo no quarto e com pouquíssimas peças de roupa, o marido ainda dormia. Talvez dormia.

Joana passou a mão levemente pelo corpo e sentiu a presença da camisola de seda, sem abrir os olhos tirou-a lentamente pensando em como seria o sonho se não tivesse acordado. Talvez continuasse o sonho se o marido acordasse e colocasse sua perna esquerda entre a suas como ele gosta de fazer, encostando o peito nas suas costas e passando a mão por baixo do seu braço... Joana estava excitada. Quis acordar o marido, mas não queria mudar de posição, passou a mão por detrás de si para tocar levemente o marido, não o alcançou. Mediu a distância em sua frente, um braço, então estava no meio da cama e um braço para trás... não alcançou o marido? Esticou mais um pouco o braço e alcançou a lateral da cama. Então abriu os olhos sobressaltada.

- Marcelo? – Chamou Joana quase num susto.

“Deve ter ido ao banheiro”, pensou. “É isso que dá tomar cerveja antes de dormir, depois da primeira não sabe a conta da última”. Joana estava agora com os olhos bem abertos, sem nenhuma chance de o sonho continuar, “talvez ele volte do banheiro animado...”. Voltou a se deitar de lado, deixou a perna esquerda um pouco afastada para quando o marido voltar já ter o espaço para a sua perna entre as dela. Esperou assim por um tempo, mas nada dele aparecer. Nada, nem um barulho sequer que viesse do banheiro. Nada. Joana sentiu vontade de se virar na cama, mas queria que o marido a encontrasse ‘nessa’ posição, ele não resistiria e o sonho teria continuidade! Mas ele não vinha! Do banheiro não vinha nenhum ruído. “Será que desmaiou?”

Sentou na cama e olhou para o relógio no celular, cinco e meia. Já não adiantaria voltar a se deitar de lado com a perna esquerda um pouco afastada, angustiada como estava, mesmo que Marcelo voltasse para o quarto cantando Roberto Carlos, não adiantaria, a ansiedade acomodara os hormônios, cada um em seu berço. O que Marcelo estaria fazendo no banheiro até esta hora? Foi lá para ver, o banheiro estava vazio, ninguém por lá. Decerto estaria na cozinha. Joana olhou-se no espelho do banheiro e se achou muito bonita! Ensaiou uns passos de dança sensual e puxou levemente a calcinha para baixo como se fizesse um strip, os hormônios acordaram e saltaram do berço num pulo só, olhou em volta, estava só. Voltou ao quarto e vestiu uma calça de abrigo rosa e uma blusa de malha fria, pôs os hormônios de volta no berço e foi até a cozinha.

Os passos ligeiros e a pisada firme denunciavam o mau humor! A luz apagada indicava que não havia ninguém preparando o café da manhã.

- Marcelo? – Agora Joana chamava em voz alta.

Olhou o relógio da parede e viu os ponteiros marcarem quinze para as seis. O dia já estava claro. Dentro de casa ele não estava, então só podia estar no quintal. A brisa fresca da manhã apanhou Joana de frente, ela sentiu aquele ar puro com cheiro das plantas. Como é bom morar numa casa com quintal grande! Os pés de acerola cheios de suas pequenas flores, as jabuticabas carregadas de frutos maduros, delícia! A goiabeira esperando pelo fim do ano e as bananeiras dando cacho. Uma pequena horta produzindo verduras para as saladas e até umas galinhas proibidas já ciscavam o quintal, tudo cuidado pelo Josimar, trabalhador que há dois anos toma conta do quintal para Joana. De agora em diante quem vai mandar nele será o Marcelo. Marcelo? Cadê o Marcelo?

- Marcelo? – Joana perguntou, mas ninguém respondeu.

Joana sentiu fome, voltou à cozinha para o desjejum. Esquentou o leite, juntou uma colherinha de café instantâneo e tomou comendo duas fatias de pão integral com geleia de amora e uma fatia de queijo prato, comeu, também, uma banana e uma maçã e foi escovar os dentes. Quando entrou no banheiro foi olhar-se no espelho e lembrou da cena de streep que ensaiara há pouco. Não resistiu e foi tirando as roupas ao som de uma música imaginária, primeiro tirou a blusa de malha fria, depois a calça de abrigo, passou a mão suavemente pelo corpo e ameaçou tirar a calcinha. Joana sentiu-se muito atraente, os hormônios estavam outra vez acordadíssimos! Daí pensou em Marcelo, por que ele não estava ali? O telefone chamou, Joana saiu em disparada para atender. Era Marcelo.

- Marcelo? Onde você está? – A voz estava aflita!

- Bom dia meu amor! Como assim, onde você está? Estou em casa, acabei de acordar.

- Em casa, como assim, eu te procurei por todo canto.

- Estou em casa, na minha casa. Bom, minha, mas só até hoje. Logo mais à tarde, quando nos casarmos, então a minha casa será aí, na tua casa e a tua casa, então, será a nossa casa. Daí você não precisará mais me procurar, pois eu vou te acordar cada dia daquele jeito que te acordei antes de ontem, de conchinha, com a minha perna entre as tuas e minha mão passeando pelo teu corpo. Ah, não vejo a hora!

4 comentários:

  1. mas bah! ...baita texto...(2)

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  2. De conchinha...Perfeito!♡

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  3. O escritor está transmitindo a ideia de antecipação e intimidade no contexto de um relacionamento prestes a se formalizar pelo casamento.

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