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sexta-feira, 27 de setembro de 2024

AS PESSOAS E AS ABELHAS (Conto)

 



Marisvaldo é um sitiante e tem uma propriedade rural no distrito de Vila Vargas, próximo do Córrego que passa pelo distrito, onde planta uma roça de mandioca que é o principal produto de comercialização. Diariamente ele arranca os pés de mandioca e leva para casa na carreta do trator Massey Ferguson 50X que comprou há três anos quando o preço da mandioca estava elevado e a safra foi muito boa, juntou o lucro da safra com as economias de anos anteriores e realizou o sonho de comprar o trator, para o que ainda faltou, fez um financiamento em 24 parcelas no Banco do Brasil. Que maravilha! Agora o trabalho está mais fácil, mais ágil e Marisvaldo  não precisa contratar trabalhadores para tantas diárias como antes.

Sentado ao volante do seu Massey Ferguson 50X, Marisvaldo vai alegremente para casa, onde Dona Marilei o espera na sombra do pé de manga para lavar as mandiocas, depois descascar, daí lavar outra vez e separar em pacotes de um quilo cada. É serviço para o dia todo. Vários dias, até o congelador se encher e Marisvaldo levar para os mercados onde os vende por R$ 3,50 o quilo, o mercado vende ao consumidor por R$ 6,50 sem ter o trabalho que Marisvaldo teve de arar a terra, plantar, capinar, colher, descascar, embalar, congelar e ainda transportar até o mercado.

- Se os humanos fossem como as abelhas, não seria desse jeito – disse Marisvaldo, no outro dia, para Dona Marilei, enquanto tomavam chimarrão antes de ir para a cidade entregar as mercadorias.

- Abelhas não plantam mandioca – respondeu Marilei, rindo e sem entender o que o marido queria dizer.

- O mercado, - disse Marisvaldo - depois que apareceu essa palavra, os animais humanos se diferenciaram dos outros animais, e para pior. Quem dera fôssemos como os outros animais, ou como as abelhas.

- O que tem as abelhas? – Perguntou Marilei ocupada com a leiteira que já fervia o leite.

O que tem as abelhas? A resposta era tão óbvia que Marisvaldo até se irritou. Será que a mulher não é capaz de pensar? Basta observar as abelhas! Enquanto a mulher esperava por uma resposta, o marido puxou do bolso uma palha de milho, encheu com o fumo cortado, enrolou a palha sobre o fumo, pôs na boca e acendeu com uma brasa do fogão, deu uma baforada bem longa e olhou para a fumaça que se ia por cima das panelas. Estava mais calmo, até sorriu.

- As abelhas, elas são insetos voadores que produzem mel com o alimento que elas tiram das flores...

- A água está quente, - observou Marilei - puxa a chaleira mais para o canto.

Marilei levantou-se da cadeira e foi coar o café, a leiteira já tinha fervido o leite e estava na beira da chapa do fogão para não derramar por cima.

- As abelhas, Mari, você me perguntou sobre as abelhas...

- Eu sei, elas fazem mel, aqui na mesa tem um pote do que você colheu em junho, ainda tem mais lá dentro, na dispensa.

- É uma metáfora, Mari. As abelhas, elas têm uma filosofia de vida melhor que os humanos.

- Filosofia? Plantar mandioca para vender e comprar coisas boas para nós e você me agradar que eu dou par você, isso é filosofia, isso é a vida!

- Antropização...

- Também não precisava me xingar, eu estava brincando, eu gosto de dar para você porque você sempre me agrada, quando vai no mercado e vende as mandiocas, sempre traz um presente para mim. Vamos tomar café que tem muita mandioca para vender.

Marilei ficou em casa e aproveitou que o marido foi para a cidade e ia demorar por lá e fez uma limpeza geral, botou roupas na máquina, limpou o banheiro e passou pano por todos os cômodos. Embaixo da cama encontrou um livro que Marisvaldo estava lendo: Introdução à Sociologia. “Esse homem ainda vai endoidecer com esses livros que anda lendo, agora deu de falar coisas que não entendo. Filosofia! E aquele palavrão, antro... não sei o quê”. Abriu o livro e ficou um tempão olhando as palavras diferentes que estavam lá. Elite, Capitalismo, Instituição, Sociedade Estamental, Alteridade, Antropologia... “Antropologia? Foi essa a palavra que o Mari me falou?” Sentou-se na cama e foi ver significado de antropologia. Leu, releu, mas não achou o que queria achar. “Que que isso tem a ver com as abelhas?

- Oi Mari, já estou de volta. Eu trouxe um presente para te agradar!

- O que tem a ver Antropologia com as abelhas?

- Antropização, a palavra é antropização, que é como o ser humano se relaciona com o meio onde vive... Deixa prá lá, depois, mais tarde, eu te agrado com o presente.

sábado, 21 de setembro de 2024

A CADEIRA

 



A cadeira é um objeto muito útil para se descansar, ou cansar quando se trabalha sentado por um longo período de tempo. Serve também para pendurar bolsas, casacos ou blusas e até subir em cima para alcançar móveis mais altos, como armários ou guarda-roupas. Outra utilidade, descoberta recentemente, em São Paulo, é que pode ser usada para esculhambar com um candidato a prefeito provocador.

A cadeira também serve para um bom bate-papo, e é disso que eu gosto, uma cadeira aqui outra ali e outra acolá e a conversa rolando entre elas fazendo amarras que só a vida sabe dar. Nada como uma cuia de chimarrão cheia de assuntos passando de mão em mão. Duas cadeiras na varanda podem suscitar segredos que não devem ir além do telhado, especialmente se rolar uma cervejinha entre o bem e o mal, o profano costuma vencer o divino nessas horas, mas é quase divino quando o chão empurra as cadeiras para unir os corpos!

Mas, se a cadeira está vazia é porque alguém a deixou lá. Alguém que se foi, talvez para nunca mais voltar, talvez para voltar algum dia com saudades, talvez para pedir perdão, talvez para tomar satisfação, talvez para se vingar. Talvez, só para tomar chimarrão. Uma cerveja. Talvez...

A cadeira da candidata Marina Helena, foi arremessada pelo candidato Datena contra o candidato Marçal. A cadeira poderia ter ficado ali e o Datena ido embora. Se o Marçal fosse mais coerente, nada teria acontecido e cada um teria sua cadeira em paz. Eu tenho a minha cadeira, mas tem uma cadeira vazia do meu lado, ela está cheia de memórias confusas. Não tem chimarrão, não tem cerveja, só um vazio cheio de emoções difusas.

Que faço com essa cadeira? Às vezes ela é mais importante que tudo que há na casa! Que amarras do passado ainda estão sentadas nessa cadeira vazia? A televisão reza um terço em volume altíssimo, denunciando surdez do ouvinte que quase não ouve. Não me acorde que estou dormindo, a voz vem da cadeira que dorme octogenária. Tem uma saudade sentada numa cadeira vazia. Cadeiras vazias não enchem o auditório da vida, elas apenas ocupam o espaço.

Tem muitas cadeiras esparramadas por aí, e eu ouço vozes de cada uma. Seriam fantasmas? Almas penadas? Vozes do além assentando no passado para lembrar duras lições que não aprendi? Uma confusão de murmúrios, risos e choro. Quem sou eu entre tantas cadeiras? Quem há de sentar na cadeira vazia ao meu lado? Brindaremos a novidade de vida ou choraremos o arrependimento eterno das incompreensões?

Quem, quem há de preencher o vazio das cadeiras imaginárias!

sábado, 14 de setembro de 2024

UMA LOUCURA POR MIM! (conto)

 



- Boa noite senhor!

O garçom cumprimentou o cliente que estava à porta. Tinha ainda a bandeja na mão, pois acabara de atender uma mesa próxima, pôs a toalha sobre o ombro e se dispôs ao recém-chegado oferecendo um lugar para que pudesse sentar-se.

- Eu estou procurando por uma mulher bonita, de uns cinquenta anos, ela já deve ter chegado.

- Como é o nome dela?

- Ela tem cabelos castanho-claro, compridos até os ombros...

- Por favor, me acompanhe.

Pode-se dizer que o bar estava lotado, diz-se lotado quando todas as mesas estão ocupadas. No caso, havia ainda algumas poucas mesas disponíveis, para uma delas o garçom ia encaminhar o cliente antes dele perguntar pela ‘mulher bonita de uns cinquenta anos”. Enquanto andavam por entre as mesas, José dos Santos, o cliente, pensava em que situação estava se metendo, tinha mesmo uma ‘mulher bonita de uns cinquenta anos’ sozinha numa mesa à sua espera? Bem, à sua espera já era querer demais, dissera-o ao garçom sem muito pensar, simplesmente disse, era o que desejava, encontrar uma ‘mulher bonita de uns cinquenta anos’, conhece-la, fazer amizade, talvez iniciar um namoro...

- Aqui, senhor!

José teve um sobressalto, como se acordasse atrasado com o despertador tocando ao ouvido. O coração acelerou, as mãos tremeram. Olhou para o garçom e queria se desculpar, mas ele já estava atendendo outra mesa que o chamara. José estava atônito, estacado diante da mesa ocupada pela ‘mulher bonita de uns cinquenta anos’, ela tinha cabelos castanho-claros, parecia simpática e era muito, muito atraente.

- Sim?

A ‘mulher bonita de uns cinquenta anos’ disse “sim?”, então era uma pergunta. José queria responder, mas como responder uma pergunta que diz simplesmente: Sim?

- Ugh... eu, eu...

- O garçom disse que o senhor estava me procurando.

- É, desculpe, acho que eu fiz uma besteira.

José não teve coragem de prosseguir com seu plano mirabolante. Nem dá para afirmar que era um plano, enquanto dirigia seu Ford Ka pelas ruas da cidade pensava que seria legal encontrar uma ‘mulher bonita de uns cinquenta anos’ hoje. Tem um ditado que diz que o pecado é como um pássaro que voa sobre a cabeça, não há nenhum problema em o pássaro voar sobre tua cabeça, mas deixa-lo fazer ninho, aí já é o mal. Não que fosse pecado deixar uma mulher bonita de uns cinquenta anos voar sobre a cabeça de José, mas pedir ao garçom para fazer ninho na mesa dessa mulher...

- Senhor?

José sentiu uma mão delicada a segurar seu braço.

- Vem, sente-se. Acho que o senhor precisa de um pouco de água. Garçom, um copo de água, por favor.

José tomou a água num gole, a mulher bonita de uns cinquenta anos tomou um copo de cerveja, ela esboçou um sorriso, era o sorriso mais lindo que José já vira na vida, era o sorriso que desejava enquanto dirigia seu Ford Ka.

- Diga, como é teu nome? Por que estava me procurando?

- Meu nome é José, José dos Santos. Essa parte não é difícil, mas, por que eu estava te procurando... isso é bem difícil... isso foi uma loucura minha...

- Uma loucura? Eu estava precisando mesmo de uma...

Ela estava também precisando de uma loucura. Que loucura! O bar estava lotado agora, nenhuma mesa estava disponível e havia clientes aguardando na porta. Em cada mesa parecia ter alguma loucura acontecendo. José desviou os olhos à esquerda da mulher bonita à sua frente e olhou para a mesas diante de si, na mesa mais próxima todos bebiam um brinde a alguém ou a alguma coisa, na outra tinha dois casais e o marido de uma colocava disfarçadamente um dos pés por debaixo da mesa, entre as pernas da mulher do outro enquanto conversava animadamente com o marido dela. O pássaro estava fazendo seu ninho!  Se olhasse cada mesa tinha lá um pássaro querendo fazer ninho... sim tinha lá suas exceções! José era uma exceção. Era?

- Qual foi a tua loucura? Me conte.

- É que, na verdade, eu não estava procurando você, quer dizer, estava, mas não era você, não era você, mas era você.

- Daí você me achou.

- Sim, daí o garçom me trouxe até aqui.

- Então vamos brindar a tua loucura, garçom um copo, não precisa, toma nesse da água mesmo.

Então brindaram à loucura, depois brindaram ao seu primeiro encontro, daí brindaram alguém ter feito uma loucura por uma mulher bonita de uns cinquenta anos, brindaram à vida, ao amor, aos desejos sexuais dos idosos, à filosofia, à literatura e ao marido da mulher bonita de uns cinquenta anos.

- Marido?

- Sim, olha ele aí, ele é escritor, vai amar essa história, certamente amanhã estará publicada na Folha de Dourados.

segunda-feira, 9 de setembro de 2024

MILAGRES

  


Experimentar o sobrenatural de um milagre é extraordinariamente bom. E, neste caso, chamamos de bom a uma sensação indescritível, fora do comum, maravilhoso. Milagres são sempre bons, são sempre extraordinários!

Extraordinário é só um modo de dizer, os milagres acontecem o tempo todo, basta entrar numa igreja, dessas ditas pentecostais, e você verá, em cada culto ou missa, relatos de livramentos, curas que a ciência não é capaz de explicar, restauração de casamentos e, nas denominações que apregoam o culto da prosperidade, milagres de sucesso empresarial e enriquecimento financeiro. Tudo vem do altíssimo!

E não é só nas igrejas, tem uma leva desses chamados ‘influencer digital’ ganhando, milagrosamente, rios de dinheiro fazendo rifas onde ninguém é sorteado. É a fé que move montanhas, e o processo de enganação é muito semelhante, primeiro se promete o Céu, seja ele o que vem depois da morte, seja ele agora apresentando os atrativos carros de luxo que serão sorteados, depois se pede o dízimo, as contribuições e as doações, pronto o milagre está realizado, igrejas e influencers se tornam empreendimentos milionários.

Um milagre! Só um milagre para fazer as igrejas se afastarem da idolatria do capitalismo e cumprir as determinações bíblicas de priorizar e acolher os mais humildes. Enquanto escrevo estas linhas, milhares de pessoas se reúnem na avenida paulista, liderados por pastores evangélicos riquíssimos, para declarar seu apoio ao homem mais rico do mundo que disse que não cumpriria as leis do nosso país.

É sobrenatural pensar que o amor possa ser vendido e comprado! Se ama mais as aparências do que o ser. Cirurgias plásticas transformam milagrosamente pessoas feias em bonitas, aumentando ainda mais o fosso entre o belo e o bonito. Nem sempre um rosto bonito é um rosto belo. Belo é aquilo que harmoniza e dá equilíbrio, bonito é aquilo que atrai. Cirurgias plásticas meramente estéticas desarmonizam o equilíbrio natural, substituindo o conceito de beleza pelo de boniteza.

Neste mundo de aparências, estamos todos precisando de um milagre. E fé não nos falta! Somos capazes de acreditar na lâmpada do Aladim e seus três desejos, acreditamos no poder do pé-de-coelho, na ferradura, na vassoura atrás da porta, chinelo de cabeça para baixo, a escada do azar, gato preto, quebrar o espelho, ver a noiva antes do casamento. Acreditamos no Papa, no Silas Malafaia, no R, R. Soares, Magno Malta. Tudo isso e todos eles fazem milagres. Milagre é a fé que move montanha, alguns movem montanhas de dinheiro!

Eu, eu preciso de um milagre chamado Serendipity!

terça-feira, 3 de setembro de 2024

QUINZE MIL!!!!!!!!!!!!!!!!

 

Ta aí a cara do meu blog. Desde 2017 eu publico nele meus escritos, Crônicas, Contos e Poesias. São mais de 430 postagens. Às vezes dá vontade de publicar um elogio para mim mesmo, dessa vez não aguentei, quando vi que tinha alcançado 15.000 visitas ao meu blog... Me desculpem aqueles que acham que devo ser sempre humilde, mas hoje vou me engrandecer!

Tudo bem que quinze mil visitas ao meu blog não é nada se comparado aos tais influencers que tem milhões de seguidores. Essa comparação também não serve, eu sou escritor, escrevo textos e o leitor é que vai formar sua opinião, diferente dos tais influencer que tem sempre uma receita prontinha, os seguidores não precisam nem pensar, quanto mais ouvem, mais ficam embrutecidos! Cá para mim, é hora de comemorar!

 


Mas, não sou só eu que escrevo, nesses anos de publicações, os leitores também participaram com, que maravilha! 408 comentários. Eu leio cada um e tenho vontade de responder, mas a maioria não se identifica, então fica meio difícil. Eu amo ler os comentários.


E é assim que a roda da vida de um escritor vai girando. Estou escrevendo meu quarto livro, que por enquanto, tem o título provisório de MUDANÇA DE FASE. Espero concluir ele até o início de 2.025. Os outros três, já publicados estão representados ali na primeira foto: JOSAFÁ, HISTÓRIAS DE ANA MAIRIA E SEU AVÔ e DOCE VENTURA.

Escrever é o que eu gosto de fazer, além de ler bons livros, muitos livros.

 


Volto a este assunto quando chegar a 20.000!!!

CHIFRE EM CABEÇA DE CAVALO. EXISTE? EXISTE!

  Já botei no título o que poderia ser uma mentira, a ciência diz que cavalos não tem chifre, nem as éguas, mas na fazenda do Romero, que ...