Hoje eu não quero comemorar. Acordei
no sossego da vida onde um ar gostoso de memória percorria todo o ambiente
refrescando as ideias e trazendo renovo de espírito. Abri as janelas do
pensamento e me deparei com paisagens verdes de lugares por onde andei.
Preguiçosamente me debrucei sobre o peitoril da idade e andei por tempos de
juventude quando jogava sinuca no bar do Seu Domingos. Era primavera e a flor, vestida
de azul, era linda! Era linda a primavera da vida e os temporais se sucediam um
após outro arrancando os brotos do renovo que insistiam em revigorar.
Acordei cedo hoje, disposto a não
fazer nada. Trabalho? Só o conceito de física que pode ser entendido como
transferência de energia para um corpo ou sistema. Nada a ver com trabalho
remunerado, aquele sistematizado para explorar um determinado grupo social em
favor de outro. Meu trabalho, hoje, é apreciar a paisagem pela janela da vida.
Logo cedo vejo um raio de sol a brilhar sobre minha alma. Enquanto a carne
milita contra o espírito a alma perambula entre o céu e o inferno, fico a
imaginar como seria o céu se eu estivesse lá. O céu tem estrelas, um horizonte
perfeito para depositar os sonhos e nuvens de algodão para o aconchego dos
prazeres mais puros. De repente uma tempestade varre as nuvens do céu e
enegrece o horizonte dos desejos levantando poeira de humanidade sobre a
primavera.
Meio dia e o sol arde sobre a alma
derretendo sonhos e abrindo rachaduras no solo fértil dos sentimentos. Entre
cardos e abrolhos vejo a vida que passa pela janela se fazendo mais e mais
inútil. A primavera voa lentamente sob o sol, deixando o suave aroma das flores
azuis, e se vai, para além da linha do horizonte, esconde sua beleza juvenil envolta
em brumas de Avalon. Mebahiah, o anjo, passa ao longe, faz sinal que quer me
falar. Deixo que se vá. Não estou disposto. Hoje não, não quero falar, só ficar
olhando. Hoje não quero nada.
Ainda na janela, vejo a paisagem da
existência e algumas nuvens estão se formando sobre a planície. Um vento forte
surge de repente e leva consigo a árvore do amor. Então vem do Sul uma brisa
refrescante. Quantas tempestades passaram pela janela? Quantas árvores foram arrancadas?
Quero fechar a janela, já não suporto mais ficar contemplando a vida! Olhei
para dentro de mim, entardecia uma luz azul no horizonte.
Mebahiah, ouvi uma voz quase
silenciosa que nada dizia. Seria o vento na janela da vida?
Bonito texto
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