O carro de som
passa na rua em frente de casa drapejando música natalina a flamular no vento
quente e traz o inverno que se pendura nas árvores enfeitadas de gélidos
cristais de algodão. Luzes piscam o colorido nos umbrais das portas sangrando a
certeza da incerteza da salvação, nesta noite não haverá a morte do
primogênito, todos estarão a adorar o deus da luxúria. Não há uma única
informação de que o dia seja 25 de dezembro, mas sem ele, a que haveríamos de
nos apegar para o milagre da multiplicação dos lucros?
É quente esta
tarde de verão dezembrino, o sol se põe, mas se esquece de retirar o calor que
dorme a noite toda até que volte o sol no dia seguinte para acrescentar ainda
mais quentura a esse dias de espera pela salvação das commodities numa chuva
que, prometida pelos homens, não vem, nem mesmo triplicando os preços
internacionais, se chovesse, a lavoura produziria e seria vendida para outros
países, pelo menos teríamos dinheiro, enquanto isso, o Salvador descansa o sono
dos justos.
Jingle Bells
flutuam na névoa poeirenta do tempo seco, brilhando notas pelo alto-falante
musical que chama consumidores para aproveitar as ofertas imperdíveis do
comércio. O amor é demonstrado em notas de dez, vinte, cinquenta, cem reais,
mas se não tiver não se preocupe, aceitamos todos os cartões. Presentear é um
gesto de amor, amor maior é presentear quem vai te presentear. Ainda que isso
seja uma verdade mentirosa, é muito verdadeira a adoração que se faz ao
verdadeiro Senhor do natal: Momo!
O espírito
natalino põe em liberdade delinquentes de bom comportamento que já estavam em
liberdade mesmo antes do espírito natalino. Agora, o espírito lhes dá poder de
persuasão e o dinheiro se aglomera em grandes cultos onde são ofertados aos
ministros e dali carreados ao altar da hipocrisia para distribuição em partes
diretamente proporcionais à capacidade de cada comerciante em ludibriar o
consumidor com ofertas ilusórias de salvação hedonista. O leão é de ouro!
Jingle Bells, Jingle Bells... ouro, incenso e
mirra flutuam os Reis Magos no estábulo, a Glória foge apressada, o Egito
cavalga a mula até o Rei, enquanto a morte domina o delinquente de bom comportamento
assentado no trono. Jingle Bells, Jingle Bells, os comerciantes do Templo fora
expulsos e as bancas derribadas! Jingle Bells, Jingle Bells, eu sei que Jesus
talvez se alegre contigo, mas você, alegra-se com a vida de Jesus?
Ele era um
revolucionário!!
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