- Mãe, estou tão feliz!!
Mais que feliz, a Brunilda estava
radiante! Novo Sarandi é uma cidade pacata, onde todos se conhecem e não dá
para fazer um evento sem que a notícia se espalhe.
- A Vó, mãe, ela vai na festa?
- Não, filha, não fica bem, ela nem
fala mais. Melhor ela ficar em casa, já contratei uma cuidadora.
Brunilda olhou-se no espelho e viu a
Lua, e o mel escorrendo. Tão distante a Lua quanto o tempo que haveria de durar
a paixão; tão doce o mel quanto o amor que espreme os corpos e retorce o favo,
colhe o doce sabor em cada gota nas entranhas do bem querer. Já colhera o
fruto, é verdade! Contratado em Cartório. Não fosse a pandemia e o padre já os
teria abençoado há tempos! Mas, como, se não for acompanhado de uma grande
festa? Agora, sim, diante de Deus e dos homens, o mesmo Deus que não faz
acepção de pessoas e homens que se acham melhores que os outros, Brunilda irá
se casar!
- Que bom que o tio chegou. Uma viagem
tão longa, pensei que talvez não viesse.
A distância e o parentesco têm quase
a mesma medida. Laços que amarram o tempo, nós que seguram sentimentos de
pertencimento. A Vó que agora já não fala palavra, gerou o tio, as tias e o
pai, é a mesma que, ainda garota, viera do Sul em aventuras da família para
recomeçar a vida por esse descampado. Se ela falasse, o que diria?
- Olha, mãe! - Brunilda tirara os olhos
do espelho para pô-los através da janela. – Um bem-te-vi, está fazendo seu
ninho onde até ontem uma pomba rola chocava seus filhotes...
O seu ninho haveria de ser original.
Nada de bem-te-vis, nem de chupins. Os filhotes haverão de ser chocados em
brumas de Avalon.
- O Padre vai nos abençoar, mas ele
não há de mandar na minha casa. É bom ser mãe?
A mãe passava as mãos pelos cabelos
da filha, puxando um cacho por sobre o ombro. A mão espalmada acolhia a mecha
de loiros cheia de sonhos de meninice. Um filme se lhe passa na memória. É bom
ser mãe? Fechou a mão e virou-se para a janela, queira esmurrar parte do
passado. A filha vai se casar.
- Sim, filha, é bom...
- A Vó não vai na festa, já não pode
mais. A tia que mora ali do outro lado da rua, a irmã da Vó, ela vai?
- Não filha, ela também já está muito
velha, não a convidei, ela anda bengala, não ia ficar bem lá na festa.
- Quando meus filhos se casarem, vai
ser feio se eles te convidarem para a festa?