Parece que estamos iguais, ele disse olhando a imagem de Jesus
pregado na cruz do calvário. Já estou virando uma caveira de tanto sofrimento. Os
malfeitores estão por todo lados só que eles não estão pregados numa cruz.
Vivem cada dia como se uma redoma de vidro os protegesse, e eu aqui doido para
jogar uma pedra e despedaçar essa vidraça!
Parece que estamos iguais, disse olhando para a imagem de Jesus,
loiro, olhos azuis, cabelos de salão de beleza, túnica lavada com homo total e
amaciante, pele macia e olhar despreocupado sobrevoando os céus enquanto seus
seguidores depositam fielmente o dízimo no gazofilácio. É bênção, disse enquanto observava a pintura
encomendada a peso de ouro a um renomado artista pagão.
Está chegando a Páscoa e eu estou chegando aos meus setenta anos
como se fosse mesmo um cordeiro indo para o matadouro. Para trás ficaram os
pastos verdes, cheios de gado gordo do patrão, por onde andei trabalhando duro
e sem lá muitos direitos. Ganhei cada dia como se fosse o único, sem saber se
teria o seguinte para ganhar.
Páscoa é tempo de
vitória! Repousando em verdes pastagens e me banhando em águas tranquilas. Olho
em redor e em derredor e só me vejo como um leão rugindo. Eu é que dou as
ordens. Não quero nem saber quem foi que cuidou do pasto e menos ainda quem fez
aquele lago maravilhoso para eu passar dias festivos com meus amigos em águas
límpidas.
Comi o pão que o diabo amassou, afinal ele é mesmo o príncipe
deste mundo. Agora vou deixar esse sofrimento, já não tenho mais forças,
deixei-as todas com o senhor deste lugar. Se juntar tudo que passei, talvez
seja como ser pregado na cruz. Cada dia fui açoitado, cada dia o madeiro ficava
mais pesado. Olho em volta e só vejo os ladrões que roubaram minhas energias.
Agora estão sorteando minha força de trabalho e se regalando no lucro que
produzi. Só me resta pensar na ressurreição.
Quem diria, dia após dia comendo do melhor desta terra. Da
sabedoria fiz as coisas deste mundo para meu prazer, da miséria do povo fiz o
templo e da ignorância minha riqueza material. Quisera eu poder viver mil anos
e ainda assim não gastaria tudo que acumulei. Mas, agora parece ter chegado ao
fim. Essa é a minha cruz, toda minha riqueza está sobre ela e eu a tenho que
carregar para a morte. Quem dera pudesse ressuscitar!
Elairton Paulo Gehlen
FELIZ
PÁSCOA!
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