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segunda-feira, 27 de junho de 2022

ADVOGADOS

             O escritório de advocacia Braga Rodrigues & Arboreda Advogados Associados fora inaugurado há mais de trinta dias e nenhum vivente aparecera para pedir ajuda por uma causa que seja.

- Tenhamos paciência, disse o Doutor Ângelo Fernandes Braga Rodrigues do Amaral, primeiro precisamos divulgar nosso trabalho, daí os clientes vão aparecer igual mosca em prato de doce!

- E como divulgaremos nosso trabalho, se não temos uma causa? Perguntou Doutor Mariano de Melo Arboreda, olhando para seu cartão de visitas que prendia entre os dedos polegar e indicador, onde se podia ler: Escritório Braga Rodrigues & Arboreda Advogados Associados.

Doutor Ângelo levantou-se, foi até a geladeira, tomou a jarra e serviu-se de um copo de água, olhou-o com cuidado para ver se não cometera nenhuma ilegalidade e tomou da água como se bebesse de algum livro de sabedoria em busca de uma resposta capaz de esclarecer a dúvida posta na mesa pelo colega associado. Deixou o copo vazio na pia da cozinha e tomou um café com açúcar cristal, nem a água, nem o café! Voltou ao colega e lhe deu a resposta mais inteligente que se pode ter quando não se tem uma resposta: fez-lhe uma pergunta!

- O que fazem os jovens quando procuram o primeiro emprego?

- Um Currículo, respondeu prontamente Arboreda.

- E depois?

- Aceitam qualquer coisa que se lhes apresenta.

Qualquer coisa é muito pouco para um advogado que deve usar gravata e ser chamado de doutor, além do mais, Braga Rodrigues era nome a ser levado em consideração, tudo bem que Arboreda não tivesse o mesmo histórico, mas, qualquer coisa?

- Tem um parente que precisa de advogado..., disse Arboreda timidamente.

“Parente” é como se referem os indígenas entre si, mesmo não tendo laços de consanguinidade. Arboreda era primo irmão de Alselmo que se casara com a Índia Niara, e esta sempre trazia notícias da Aldeia e sabendo que Arboreda formara-se doutor advogado, fizera o marido levar ao primo a notícia do Parente que estava preso há mais de ano por ter matado um jagunço.

- Não estou muito afeito a causas indígenas, reclamou o Doutor Ângelo.

- Eu também não, respondeu o Doutor Arboreda, não estou afeito a nenhuma causa porque não temos nenhuma causa...

Ia o Doutor Arboreda ainda argumentar, citando literatura sobre casos estudados de escritórios de advocacia que ficaram por mais de um ano sem atender um cliente se quer e, ainda assim, em menos de dez anos de trabalho já teriam alcançado alguma relevância no meio jurídico, inclusive o caso de um advogado que teria montado escritório sem nenhum outro causídico em sociedade e depois de cinco anos sem atender nenhuma causa, fora aprovado em concurso público e se tornara Juiz de direito do Fórum em sua cidade no estado do Paraná, mas, quando disse: Literatura, Doutor Ângelo deu-lhe as costas e foi-se ao Bar do Ponto no andar térreo e pediu uma cerveja. Uma hora depois Doutor Arboreda também desceu as escadas e juntou-se ao sócio para encaminhar o caso do esvaziamento da terceira garrafa, ali chegaram a um acordo: fechariam o escritório por duas semanas para um recesso e depois discutiriam sobre como alcançar algum desgraçado que pudesse ser o primeiro cliente, ainda que tivessem que oferecer um brinde aos primeiros interessados nos serviços de assistência jurídica do Escritório Braga Rodrigues & Arboreda Advogados Associados.

- Quer mais desgraçado do que um Índio preso sem provas concretas, sem advogado, sem dinheiro e sem uma alma benevolente que lhe preste qualquer auxílio no conhecimento das leis que possam auxiliar para que se defenda? Pois, se é um desgraçado que precisamos, aí temos um...

 - Caveats; Capiats, respondeu o Doutor Ângelo e foi embora deixando a conta para o sócio.

Arboreda ficou com raiva, pagou a conta e foi tomar mais uma cerveja na lanchonete do Aloisio, onde comeu um X-Salada e conversou com o dono do bar, depois foi para casa. Três dias depois estava confortavelmente sentado em um banco de tábuas, numa casa de pau-a-pique, no meio da reserva indígena Caiuá, diante do primo irmão e da sua mulher.

- Meu sócio fechou o escritório por duas semanas, então esse é o tempo que eu tenho para ajudar...

Duas semanas depois, Arboreda, municiado da devida procuração e de provas bastante contundentes e uma lista de testemunhas presenciais, além de documentos com relatos de outras importantes testemunhas abonatórias, deu entrada no Cartório da Primeira Vara da Justiça Federal, apresentando a defesa do Réu Jucimar Ojeda. Voltou ao escritório vestido de terno e gravata, chinelos de dedo nos pés e um Cocar na cabeça.

- Temos uma causa, disse eufórico, e estamos vencendo, nosso cliente deixou a prisão e está respondendo ao processo em liberdade!

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