O escritório de advocacia Braga Rodrigues & Arboreda Advogados Associados fora inaugurado há mais de trinta dias e nenhum vivente aparecera para pedir ajuda por uma causa que seja.
- Tenhamos paciência, disse o Doutor
Ângelo Fernandes Braga Rodrigues do Amaral, primeiro precisamos divulgar nosso
trabalho, daí os clientes vão aparecer igual mosca em prato de doce!
- E como divulgaremos nosso trabalho,
se não temos uma causa? Perguntou Doutor Mariano de Melo Arboreda, olhando para
seu cartão de visitas que prendia entre os dedos polegar e indicador, onde se
podia ler: Escritório Braga Rodrigues &
Arboreda Advogados Associados.
Doutor Ângelo levantou-se, foi até a
geladeira, tomou a jarra e serviu-se de um copo de água, olhou-o com cuidado
para ver se não cometera nenhuma ilegalidade e tomou da água como se bebesse de
algum livro de sabedoria em busca de uma resposta capaz de esclarecer a dúvida
posta na mesa pelo colega associado. Deixou o copo vazio na pia da cozinha e
tomou um café com açúcar cristal, nem a água, nem o café! Voltou ao colega e
lhe deu a resposta mais inteligente que se pode ter quando não se tem uma
resposta: fez-lhe uma pergunta!
- O que fazem os jovens quando
procuram o primeiro emprego?
- Um Currículo, respondeu prontamente
Arboreda.
- E depois?
- Aceitam qualquer coisa que se lhes
apresenta.
Qualquer coisa é muito pouco para um
advogado que deve usar gravata e ser chamado de doutor, além do mais, Braga
Rodrigues era nome a ser levado em consideração, tudo bem que Arboreda não
tivesse o mesmo histórico, mas, qualquer coisa?
- Tem um parente que precisa de
advogado..., disse Arboreda timidamente.
“Parente” é
como se referem os indígenas entre si, mesmo não tendo laços de
consanguinidade. Arboreda era primo irmão de Alselmo que se casara com a Índia
Niara, e esta sempre trazia notícias da Aldeia e sabendo que Arboreda
formara-se doutor advogado, fizera o marido levar ao primo a notícia do Parente que estava preso há mais de ano
por ter matado um jagunço.
- Não estou muito afeito a causas
indígenas, reclamou o Doutor Ângelo.
- Eu também não, respondeu o Doutor
Arboreda, não estou afeito a nenhuma causa porque não temos nenhuma causa...
Ia o Doutor Arboreda ainda
argumentar, citando literatura sobre casos estudados de escritórios de
advocacia que ficaram por mais de um ano sem atender um cliente se quer e,
ainda assim, em menos de dez anos de trabalho já teriam alcançado alguma
relevância no meio jurídico, inclusive o caso de um advogado que teria montado
escritório sem nenhum outro causídico em sociedade e depois de cinco anos sem
atender nenhuma causa, fora aprovado em concurso público e se tornara Juiz de
direito do Fórum em sua cidade no estado do Paraná, mas, quando disse: Literatura, Doutor Ângelo deu-lhe as
costas e foi-se ao Bar do Ponto no andar térreo e pediu uma cerveja. Uma hora
depois Doutor Arboreda também desceu as escadas e juntou-se ao sócio para encaminhar
o caso do esvaziamento da terceira garrafa, ali chegaram a um acordo: fechariam
o escritório por duas semanas para um recesso e depois discutiriam sobre como
alcançar algum desgraçado que pudesse ser o primeiro cliente, ainda que
tivessem que oferecer um brinde aos primeiros interessados nos serviços de
assistência jurídica do Escritório Braga Rodrigues & Arboreda Advogados
Associados.
- Quer mais desgraçado do que um
Índio preso sem provas concretas, sem advogado, sem dinheiro e sem uma alma benevolente
que lhe preste qualquer auxílio no conhecimento das leis que possam auxiliar
para que se defenda? Pois, se é um desgraçado que precisamos, aí temos um...
- Caveats;
Capiats, respondeu o Doutor Ângelo e foi embora deixando a conta para o
sócio.
Arboreda ficou com raiva, pagou a
conta e foi tomar mais uma cerveja na lanchonete do Aloisio, onde comeu um
X-Salada e conversou com o dono do bar, depois foi para casa. Três dias depois
estava confortavelmente sentado em um banco de tábuas, numa casa de pau-a-pique,
no meio da reserva indígena Caiuá,
diante do primo irmão e da sua mulher.
- Meu sócio fechou o escritório por
duas semanas, então esse é o tempo que eu tenho para ajudar...
Duas semanas depois, Arboreda,
municiado da devida procuração e de provas bastante contundentes e uma lista de
testemunhas presenciais, além de documentos com relatos de outras importantes
testemunhas abonatórias, deu entrada no Cartório da Primeira Vara da Justiça
Federal, apresentando a defesa do Réu Jucimar Ojeda. Voltou ao escritório
vestido de terno e gravata, chinelos de dedo nos pés e um Cocar na cabeça.
- Temos uma causa, disse eufórico, e
estamos vencendo, nosso cliente deixou a prisão e está respondendo ao processo
em liberdade!
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