Hoje estou em Campo Grande, cidade
Morena! por uma noite, amanhã me vou para o nascimento, não o meu, Natal, no
Rio Grande do Norte, só que para chegar aqui, na Morena, vindo de Dourados,
claro, tinha que ter uma parada na Água Rica. Os douradenses sabem muito bem o
que é esse lugar, ninguém vai à Campo Grande sem parar na Água Rica, lugar meio
mágico, lá tem, com certeza, a melhor Chipa
do mundo! O que é Chipa? Todo Sul Mato-grossense sabe, o resto do mundo acho
que não. Um dia eu estava em Brasília e pedi para a garçonete: dá uma ‘chipa’,
ela disse: O quê?
Quisera eu voltar ao tempo em que
parei pela primeira vez na Água Rica, ah, quem dera! Tinha eu então vinte e
dois anos de idade e me ia num Maverick
lotado de sonhos entre Campo Grande e Iguatemi onde meus pesadelos se
transformariam em literatura pela primeira vez. Aquele lugar no meio do nada
poderia ser só uma lanchonete no meio do caminho, não era, era a Água Rica! Meus sonhos de juventude se
transformaram em escritos no jornal A
Notícia e os cinco livros adquiridos em Iguatemi se multiplicaram na
biblioteca de Amambai onde virei quase literalmente um ‘rato de biblioteca’.
Jorge Amado me levou ao comunismo e este a muitas viagens à Cidade Morena, e
cada viagem a uma parada na Água Rica: duas chipas e um pingado, café com
leite.
Tomei um pingado e perguntei a idade
da Água Rica: 63 anos! Os poetas todos que conheço, todos, comeram chipa lá. Muitos comunistas, durante a
ditadura que tolerava a lanchonete, mas não as ideias; mitos cronistas que
driblavam a censura que parecia nada entender de figuras de linguagem; alguns
filósofos que insistiam em pensar quando isso era definitivamente proibido e
até músicos que teimavam em ver o dia ser novo apesar de você!
Depois do pingado, entrei na Van como
entrara dezenas de vezes na Parati do sindicato dos bancários quando era
diretor da CUT MS. Todas segunda-feira saia atrasado de Dourados para chegar
cedo em Campo Grande. Não tinha essa loucura de trânsito e andar a cento e
setenta por hora era, digamos, natural para um revolucionário que tinha pressa
em fazer a revolução! Uma senhora, talvez idosa, calculei uns sessenta anos de
idade, sentou-se ao meu lado e não parava de passar o dedo indicador pela tela
do celular parecendo adolescente.
- Ooooi, bibibijuju, ela disse para o
celular, onde aparecia uma imagem de criança. Que linda, titia tá com saudades,
ela dizia para o telefone sem se importar comigo no banco ao lado. Não pude
evitar a indelicadeza de olhar para a telinha, Julinana, do outro lado do
telefone, parecida nem se importar com a encenação da tia, enfiou o dedo no
nariz à procura de uma caquinha
qualquer e deixou o dedo lá até que a tia pediu pela n-ézima vez para ela
tirar, não tirou e a tia achou ela a sobrinha mais linda do mundo! Um minuto
depois e eu olhava a paisagem que passava em alta velocidade pela janela da Van
quando pensei estar alguém falando comigo, virei-me imediatamente para dentro e
outra vez olhei quase sem querer para a imagem no smartphone e a minha vizinha de assento falava com a mãe, era um
recado do Pedrinho. Aí lembrei do Pedro Vitor, meu filho, mas não liguei para
ele. Água Rica estava ficando para trás, mas a riqueza da vida fluía em alta
velocidade!
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