Dia 27 de setembro aconteceu um
debate com as lideranças indígenas e o foco eram os jovens associados da AJI-
Associação dos Jovens Indígenas das Aldeias de Dourados. Esse evento faz parte
da mobilização anual que ocorre sempre em setembro para que se alcancem os
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável definidos pela Assembleia Geral das
Nações unidas.
Eu tive a alegria de ser um dos
poucos convidados a assistir calado a cada uma das falas dos representantes dos
povos originais. Fiquei sabendo, por exemplo, que o Brasil é um dos países que
têm o maior número de línguas indígenas do mundo. Conheci a Graciela Guarani
que é, talvez, a mais importante cineasta indígena da atualidade. A Lucimar e a
Tatiane que são assistentes sociais e fazem um belíssimo trabalho nas Aldeias.
A Diana e a Rosilene que são professoras e outros vários participantes, todos
com seu saber e, ficar calado, para mim não foi nenhuma dificuldade, as duas
horas do debate passaram muito rapidamente e só no final, no finalzinho mesmo,
dei um pitaco de opinião.
Os jovens indígenas da AJI, através
das suas lideranças, nos trouxeram para o debate, talvez a sua mais dura
realidade. Herdeiros de povos de vida livre e historicamente preservadores da
natureza, das quais sempre tiraram seu sustento, esses jovens agora são nascidos
em Aldeias devastadas, não há matas, falta o alimento e até a água. O contato
com o “branco” é inevitável. Daí entram para as Aldeias as doenças, as drogas
ilícitas, a exploração da mão-de-obra, o preconceito, a miséria, a
criminalidade, a política partidária, a violência e até o ódio de quem gostaria
de lhes tirar até esta que é a última reserva de terras que lhes abriga o
sonho.
Acrescentei aí acima alguns itens por
minha conta. O debate foi de altíssimo nível e tratou de questões essenciais
aos povos nativos. Dentre os temas apresentados para se visualizar uma
perspectiva à essa juventude, o reflorestamento parece ter alcançado
unanimidade, até porque essa palavra pode ter seu significado ampliado, além do
plantio das árvores para devolver ao ambiente seu estado original de mata,
também se pode pensar em reflorestar as ideias, devolvendo ao povo seu estado
original de preservação da natureza e convivência equilibrada com os demais
habitantes do ambiente, os outros animais, aves, peixes, insetos, enfim tudo
que a natureza produz e com o que vive em harmonia.
Quando me deram a palavra, no último
minuto, o Itacir, um dos coordenadores, me apresentou, dizendo que eu era escritor e poeta. Imediatamente me
apropriei do debate e gastei meu minuto pensando alto e aí acabou o tempo e eu
continuei pensando até de madrugada sobre esse tal reflorestamento. Sim,
haveria de ser um reflorestamento com muitas árvores, frondosas para sombra e
abrigo dos animais e aves; frutíferas para alimento; floridas para embelezar o
ambiente e alimentar o beija-flor e dar sustento às abelhas; arbustos para
proteção do solo e abrigo aos animais rasteiros.
Seria necessário que o
reflorestamento invadisse as pessoas para que estas pudessem reaprender a viver
livres na natureza. Livres de quê?? Da razão, pecado original descrito no livro
de Gêneses quando Eva e Adão comeram do fruto da árvore do conhecimento e foram
expulsos do Jardim. Reflorestar é a possibilidade de voltar ao Jardim. Só os
jovens da AJI podem fazer isso, os “brancos” estão tão contaminados com a
racionalidade que não suportam a ideia de preservação ambiental.
Reflorestar as ideias também é saber
que no entorno estão os inimigos, beligerantes, estúpidos e absurdamente
arrogantes. Sim, os “brancos”. Decididos a eliminar o último bastião de
floresta, não saberão jamais o significado de reflorestamento até que a última
gota d’água seque na última raiz de planta vendida em commodities internacionais. O homem “branco” expulso do Jardim do
Éden, fatalmente sofrerá dos males do Apocalipse.
De repente fiquei me perguntando: Por
que eu estava lá? Talvez como Cazuza, que dizia que a burguesia fede e que ele
também era burguês, mas era poeta; não sei, talvez: Ser poeta, para Cazuza pode ter sido a sua tomada de consciência de
que os seus burgueses já estavam apodrecidos, fedendo. Quem sabe este “branco”
não tenha descoberto a mesma coisa. Pois bem, Cazuza, eu sou branco, mas sou
poeta!
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