Está chovendo
Esta chuva há de chegar até aí
Quando chegar
Molha tua mão
Hei de mandar com a chuva um beijo
Toma-o para ti
Põe em teus lábios
E hás de sentir minha presença
Está chovendo
Esta chuva há de chegar até aí
Quando chegar
Molha tua mão
Hei de mandar com a chuva um beijo
Toma-o para ti
Põe em teus lábios
E hás de sentir minha presença
Não sei de onde tirei essa ideia de ler Rubem Braga, mas certo é que pedi uns livros na Amazon e tenho gasto um tempo especialmente com suas crônicas. Algumas delas, escritas há setenta anos, parecem ser destinadas ao momento atual da política em Dourados, talvez ao próprio prefeito Alan Guedes. Teria ele, o Braga, uma bola de cristal ou, sendo um imortal da Academia, esteja ainda vivo e em sua imortalidade transite por tempos futuros para escrever no passado coisas do porvir!!! Ando pensando em me candidatar a uma vaga pela imortalidade. Será o presidente da ADL me aceitaria? Assim poderíamos deixar de lado coisas como a Farra da publicidade e focar em crônicas futuristas onde, quiçá, essa dinheirama toda seja destinada aos produtores rurais familiares e o povo tenha alimentos mais saudáveis.
A crônica ‘Bilhete a um Candidato’ parece ter sido escrita pessoalmente para o
Barbosinha, em 1.960!!! Atualíssima! Se o Candidato do DEM tivesse lido,
talvez não perdesse a eleição. Na época da eleição eu era presidente da
Associação dos Produtores Rurais da Agricultura Familiar do Alto Café,
provavelmente a Entidade que mais tenha se dedicado na construção de um projeto
viável para o desenvolvimento da piscicultura neste município. Queríamos
discutir o projeto com o candidato, mas ele lá não foi e seus representantes
diziam que já estava sobrando votos, a eleição estava ganha. Alan Guedes, foi
pessoalmente, acreditando na virada. Virou!
Virou Prefeito e rapidamente levou
para seu gabinete o cara que fazia a farra, da publicidade, quando o agora
alcaide ainda era presidente da Câmara de Vereadores. Talvez o mestre Rubem
Braga, com toda a ironia de que era capaz, dissesse ao Alan Guedes que, não
sendo tão sábio quanto o prefeito, seria incapaz de apontar todas as
maracutaias, mas que elas existem, sim, existem. Eu não sei, mas tem um ditado
que onde tem fumaça tem fogo! O Ministério Público, se mexer nessa fumaceira,
há de encontrar o braseiro ainda em chamas.
Me permita, Rubem Braga, revolver no
teu passado, tão presente, e dele copiar umas ideias críticas. Certamente não
hás de revirar-te no túmulo, afinal és um imortal da Academia e as tuas
críticas aos poderosos permanecem atualíssimas! Como dirias, não sou tão sábio
quanto nosso Excelentíssimo Prefeito, mas em meu humilde entendimento, um
milhão de reais, gastos sem nenhum benefício à sociedade, seriam suficientes
para custear todo o projeto da tão sonhada piscicultura em Dourados, com
produção de, no mínimo, cem toneladas de peixe por ano, processados e embalados
com selo do SIM- Serviço de Inspeção Municipal, para o comércio, gerando
emprego e renda a dezenas de produtores rurais da agricultura familiar, além de
proporcionar a proteína a preços mais acessíveis aos consumidores e ainda girar
o dinheiro dentro do município, desenvolvendo o comércio local.
Pois bem, Rubem Braga, não posso
dizer que a sabedoria das prioridades seja exclusividade ao Alan Guedes. Herdeiro
do Tal, o atual presidente da Câmara de Vereadores, estava animado para
contratar uma empresa para transmitir as sessões do legislativo e outras
notícias em redes sociais que ninguém, ou quase ninguém vê, pela bagatela de
uns oitocentos e cinquenta mil reais por ano, valor suficiente para instalar
pelo menos quatro abatedouros de peixe, o suficiente para atender toda a
demanda dos agricultores familiares do município.
Bem, não estando eu em cargo algum
dessa ou daquela gestão, talvez eu não consiga mesmo entender a importância de
se gastar aí uns dois milhões de reais em publicidade. Se fosse na produção de
peixe, então teríamos uma crise de superprodução, é isso???
Já pensou em comprar um apartamento de trinta metros quadrados, num resort de luxo, por um milhão e quinhentos mil reais? Pois é, tem quem compra, e não são poucos. Esse negócio é gigantesco e já se espalha pelo Brasil à fora com a promessa de um excelente investimento financeiro! Afinal, o que um cronista tem a ver com isso?
Às vezes as crônicas servem para se
fazer uma denúncia grave de um jeito bem-humorado. Rubem Braga era mestre,
escrevia críticas ácidas aos governos em forma de crônica, talvez na próxima eu
faça uma referência a ele. Hoje vou relatar o acontecido comigo, já pela segunda
vez, quando me fizeram essa proposta imperdível de investimento financeiro. Não
que eu tenha um milhão e meio de reais, se tivesse comprava uma fazenda em vez
de um apartamento.
As autoridades não ligam nenhum
pouquinho para esse negócio, afinal, estamos num país capitalista e liberal,
nada mais justo que tirar o dinheiro das pessoas, desavergonhadamente, e
receber medalhas de mérito pelo sucesso alcançado nos negócios! Funciona mais
ou menos assim: As moças bonitas fazem o papel delas, ficam pela orla, atraem
visitantes, oferecem prêmios se algum desavisado concordar em entrar e ver a
proposta. O prêmio é real, que me perdoem os malandros milionários, mas sabendo
que ia mesmo ganhar o brinde, aceitei gastar uma hora de meu tempo inútil e
conhecer o projeto.
Há uns três ou quatro anos atrás
quando estive em Caldas Novas, ganhei um almoço, agora o brinde foi de oitenta
reais para fazer um passeio turístico. Nada mal para quem tem consciência que
não vai mesmo fechar negócio milionário em uma hora de conversa. Por questão
moral, antes de entrar avisei que não faria qualquer negócio, a moça deu um
sorriso amigável e disse que se eu entrasse, além de ganhar o brinde, ainda a
ajudaria a cumprir sua meta, o seu salário depende de quantas pessoas ela é
capaz de enganar, quer dizer, convencer a ser iludido, digo, ouvir o que os
representantes da empresas tem a dizer. O salário deles também depende de
quantos eles conseguem enganar, quis dizer convencer a assinar imediatamente o
contrato de compra e venda de pelo menos uma parte de cinquenta e duas de um
apartamento de trinta metros quadrados.
A proposta não diz que tu estás
comprando um apartamento por um milhão e meio. Também não diz que tu tens que
assinar imediatamente o contrato. Mas, se concordares em assinar imediatamente
irás pagar a bagatela de trinta mil reais, mais alguma coisa, por uma de
cinquenta e duas partes, isso significa que o mesmo apartamento terá cinquenta
e dois donos, cada um podendo utilizá-lo por, no máximo, sete dias por ano!
Não tenho absolutamente nada para fazer nestes dias de Natal, então fico observando gente, isso enche de ideias um escrevinhador que de repente resolve se perder nos cafundós do Nordeste. E gente não falta, nestes tempos de pandemia o avião falava repetidas vezes da necessidade de se manter o afastamento e tudo o mais para evitar a transmissão do vírus, mas os assentos estavam todos ocupados e o distanciamento era de aproximadamente cinco centímetros entre um passageiro e outro, lucrar é preciso! A refeição, ou seja lá como chamam aquilo que se serve nos aviões hoje em dia, não foi servida por motivo de cuidados com a saúde.
E por falar em refeição, ontem fui
almoçar num restaurante chamado Caranguejo, pedi um prato com camarão e fiquei
um longo tempo curtindo música nordestina ao vivo até que o garçom trouxe a
comida. Podia demorar mais, nenhum problema na espera, além da boa música de
forró, na mesa ao lado tinha uma atração mais que especial, daquelas que dá
vontade de ficar ali só observando que não cansa. Também esperando pelo pedido,
um senhor de uns oitenta anos tomava suco de melão enquanto procurava por algo
no celular. Com o celular na mão, sua esposa, talvez com a mesma idade, se
deliciava num copo de caipirinha, bebericava, olhava a telinha, esboçava um
sorriso e voltava para mais um gole. Só por isso já valeu a espera, a música
veio de brinde. Só espero que o Couvert
especial que paguei tenha sido para esses artistas!
Do outro lado da rua um mar de gente
atraídos pelo mar de Ponta Negra, parecia ter esquecido completamente os
perigos da pandemia. Fiz umas contas com minha cabeça de matemático e calculei
que seria impossível servir almoço para toda aquela multidão sem que
acontecesse por ali o milagre da multiplicação dos pães e peixes, talvez camarão
ou quem sabe caranguejos. Observando com cuidado dava para perceber que boa
parte esperava mesmo por um milagre, mas pelo comportamento, acho que o Mestre
teria ido logo cedo para a outra margem do mar do atlântico.
Muito parecidos com templos religiosos,
os restaurantes escalavam seus ministros para receberem os visitantes na porta
convidando-os a entrarem onde eram recebidos com alegria e júbilo, participavam
do ritual dos pedidos, depois de ingerirem muita bebida muitos confessavam
publicamente seus pecados, se fartavam de comida até transbordar e por fim
deixavam na maquininha do cartão as suas ofertas abundantes.
Estávamos sem nenhuma pressa, o casal
de idosos e eu, eles com suas bebidas e o celular, eu com eles. Meu almoço foi
servido, olhei para a mesa ao lado, outro atendente servia uma panela de barro
da qual nossa talentosa personagem tirou um caranguejo e foi destruindo no modo
esquartejador, primeiro com as mãos e depois com um Socador. Finda a
caipirinha, veio a cerveja e eu, que tomava água mineral, fiquei pensando que
aos oitenta vou querer uma caipirinha e caranguejo com cerveja, se o destino me
presentear uma velhinha de companhia. Talvez eu volte para Natal!
Hoje estou em Campo Grande, cidade
Morena! por uma noite, amanhã me vou para o nascimento, não o meu, Natal, no
Rio Grande do Norte, só que para chegar aqui, na Morena, vindo de Dourados,
claro, tinha que ter uma parada na Água Rica. Os douradenses sabem muito bem o
que é esse lugar, ninguém vai à Campo Grande sem parar na Água Rica, lugar meio
mágico, lá tem, com certeza, a melhor Chipa
do mundo! O que é Chipa? Todo Sul Mato-grossense sabe, o resto do mundo acho
que não. Um dia eu estava em Brasília e pedi para a garçonete: dá uma ‘chipa’,
ela disse: O quê?
Quisera eu voltar ao tempo em que
parei pela primeira vez na Água Rica, ah, quem dera! Tinha eu então vinte e
dois anos de idade e me ia num Maverick
lotado de sonhos entre Campo Grande e Iguatemi onde meus pesadelos se
transformariam em literatura pela primeira vez. Aquele lugar no meio do nada
poderia ser só uma lanchonete no meio do caminho, não era, era a Água Rica! Meus sonhos de juventude se
transformaram em escritos no jornal A
Notícia e os cinco livros adquiridos em Iguatemi se multiplicaram na
biblioteca de Amambai onde virei quase literalmente um ‘rato de biblioteca’.
Jorge Amado me levou ao comunismo e este a muitas viagens à Cidade Morena, e
cada viagem a uma parada na Água Rica: duas chipas e um pingado, café com
leite.
Tomei um pingado e perguntei a idade
da Água Rica: 63 anos! Os poetas todos que conheço, todos, comeram chipa lá. Muitos comunistas, durante a
ditadura que tolerava a lanchonete, mas não as ideias; mitos cronistas que
driblavam a censura que parecia nada entender de figuras de linguagem; alguns
filósofos que insistiam em pensar quando isso era definitivamente proibido e
até músicos que teimavam em ver o dia ser novo apesar de você!
Depois do pingado, entrei na Van como
entrara dezenas de vezes na Parati do sindicato dos bancários quando era
diretor da CUT MS. Todas segunda-feira saia atrasado de Dourados para chegar
cedo em Campo Grande. Não tinha essa loucura de trânsito e andar a cento e
setenta por hora era, digamos, natural para um revolucionário que tinha pressa
em fazer a revolução! Uma senhora, talvez idosa, calculei uns sessenta anos de
idade, sentou-se ao meu lado e não parava de passar o dedo indicador pela tela
do celular parecendo adolescente.
- Ooooi, bibibijuju, ela disse para o
celular, onde aparecia uma imagem de criança. Que linda, titia tá com saudades,
ela dizia para o telefone sem se importar comigo no banco ao lado. Não pude
evitar a indelicadeza de olhar para a telinha, Julinana, do outro lado do
telefone, parecida nem se importar com a encenação da tia, enfiou o dedo no
nariz à procura de uma caquinha
qualquer e deixou o dedo lá até que a tia pediu pela n-ézima vez para ela
tirar, não tirou e a tia achou ela a sobrinha mais linda do mundo! Um minuto
depois e eu olhava a paisagem que passava em alta velocidade pela janela da Van
quando pensei estar alguém falando comigo, virei-me imediatamente para dentro e
outra vez olhei quase sem querer para a imagem no smartphone e a minha vizinha de assento falava com a mãe, era um
recado do Pedrinho. Aí lembrei do Pedro Vitor, meu filho, mas não liguei para
ele. Água Rica estava ficando para trás, mas a riqueza da vida fluía em alta
velocidade!
Dia 27 de setembro aconteceu um
debate com as lideranças indígenas e o foco eram os jovens associados da AJI-
Associação dos Jovens Indígenas das Aldeias de Dourados. Esse evento faz parte
da mobilização anual que ocorre sempre em setembro para que se alcancem os
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável definidos pela Assembleia Geral das
Nações unidas.
Eu tive a alegria de ser um dos
poucos convidados a assistir calado a cada uma das falas dos representantes dos
povos originais. Fiquei sabendo, por exemplo, que o Brasil é um dos países que
têm o maior número de línguas indígenas do mundo. Conheci a Graciela Guarani
que é, talvez, a mais importante cineasta indígena da atualidade. A Lucimar e a
Tatiane que são assistentes sociais e fazem um belíssimo trabalho nas Aldeias.
A Diana e a Rosilene que são professoras e outros vários participantes, todos
com seu saber e, ficar calado, para mim não foi nenhuma dificuldade, as duas
horas do debate passaram muito rapidamente e só no final, no finalzinho mesmo,
dei um pitaco de opinião.
Os jovens indígenas da AJI, através
das suas lideranças, nos trouxeram para o debate, talvez a sua mais dura
realidade. Herdeiros de povos de vida livre e historicamente preservadores da
natureza, das quais sempre tiraram seu sustento, esses jovens agora são nascidos
em Aldeias devastadas, não há matas, falta o alimento e até a água. O contato
com o “branco” é inevitável. Daí entram para as Aldeias as doenças, as drogas
ilícitas, a exploração da mão-de-obra, o preconceito, a miséria, a
criminalidade, a política partidária, a violência e até o ódio de quem gostaria
de lhes tirar até esta que é a última reserva de terras que lhes abriga o
sonho.
Acrescentei aí acima alguns itens por
minha conta. O debate foi de altíssimo nível e tratou de questões essenciais
aos povos nativos. Dentre os temas apresentados para se visualizar uma
perspectiva à essa juventude, o reflorestamento parece ter alcançado
unanimidade, até porque essa palavra pode ter seu significado ampliado, além do
plantio das árvores para devolver ao ambiente seu estado original de mata,
também se pode pensar em reflorestar as ideias, devolvendo ao povo seu estado
original de preservação da natureza e convivência equilibrada com os demais
habitantes do ambiente, os outros animais, aves, peixes, insetos, enfim tudo
que a natureza produz e com o que vive em harmonia.
Quando me deram a palavra, no último
minuto, o Itacir, um dos coordenadores, me apresentou, dizendo que eu era escritor e poeta. Imediatamente me
apropriei do debate e gastei meu minuto pensando alto e aí acabou o tempo e eu
continuei pensando até de madrugada sobre esse tal reflorestamento. Sim,
haveria de ser um reflorestamento com muitas árvores, frondosas para sombra e
abrigo dos animais e aves; frutíferas para alimento; floridas para embelezar o
ambiente e alimentar o beija-flor e dar sustento às abelhas; arbustos para
proteção do solo e abrigo aos animais rasteiros.
Seria necessário que o
reflorestamento invadisse as pessoas para que estas pudessem reaprender a viver
livres na natureza. Livres de quê?? Da razão, pecado original descrito no livro
de Gêneses quando Eva e Adão comeram do fruto da árvore do conhecimento e foram
expulsos do Jardim. Reflorestar é a possibilidade de voltar ao Jardim. Só os
jovens da AJI podem fazer isso, os “brancos” estão tão contaminados com a
racionalidade que não suportam a ideia de preservação ambiental.
Reflorestar as ideias também é saber
que no entorno estão os inimigos, beligerantes, estúpidos e absurdamente
arrogantes. Sim, os “brancos”. Decididos a eliminar o último bastião de
floresta, não saberão jamais o significado de reflorestamento até que a última
gota d’água seque na última raiz de planta vendida em commodities internacionais. O homem “branco” expulso do Jardim do
Éden, fatalmente sofrerá dos males do Apocalipse.
De repente fiquei me perguntando: Por
que eu estava lá? Talvez como Cazuza, que dizia que a burguesia fede e que ele
também era burguês, mas era poeta; não sei, talvez: Ser poeta, para Cazuza pode ter sido a sua tomada de consciência de
que os seus burgueses já estavam apodrecidos, fedendo. Quem sabe este “branco”
não tenha descoberto a mesma coisa. Pois bem, Cazuza, eu sou branco, mas sou
poeta!
Já botei no título o que poderia ser uma mentira, a ciência diz que cavalos não tem chifre, nem as éguas, mas na fazenda do Romero, que ...