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sexta-feira, 15 de março de 2019

CONVERSA


Tomou emprestado a Joel, a roupa de água estendida no varal, para trazer à vida a morte. A roupa do Joel estendida no varal não era a morte, nem foi a roupa que veio à vida, só a metáfora. De tão bonita que era, fez lembrar de Manuela estendo roupas para secar ao sol. Estendidas as roupas, secava-se também espraiada numa cadeira de balanço, daquelas que regula o encosto das costas e quase se deita como numa esteira de praia. Manuela estendia todas as roupas, era tão ‘todas’, que ficava estendida ao sol usando somente uma única e tão pequena peça de roupa que parecida mesmo não estar usando nenhuma.

Casado a pouco, os olhos armados até os dentes percorriam as muralhas do varal atentos a qualquer movimento suspeito. Depois vinham as noites de festa e os filhos aumentando as roupas do varal, que agora ocupavam o lugar da cadeira.

Chovia e as ‘roupas de água’ estendidas no varal lembravam Manuela. Os filhos se foram comprar roupas para seus próprios varais. Manuela nunca mais secou-se ao sol. Horas inteiras ficavam na varanda tomando chimarrão e falando dos netos: Tão bonitos eles estão!

A cadeira da varanda agora fala insistentemente da morte que levou para o infinito aquela que usara a minúscula peça de roupa ao sol. Mas a morte, sentada na cadeira da varanda, consolando a infinita dor da perda, em todo o tempo lembrava da solidão, ainda mais cruel que a morte.

 

Elairton Paulo Gehlen

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