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sexta-feira, 14 de junho de 2019

AS FOLHAS FICAM VERMELHAS NO OUTONO.


E numa dessas tardes friazinhas do outono, o sol a pino e as nuvens desaparecidas, até o cheiro do frio irrita as narinas e o aroma do relacionamento ocupa um bom espaço nos pensamentos alimentando a ideia de que o calor vai voltar para compor o cobertor do entendimento enquanto as mãos tecem as roupas de dormir.
Não é frio quando os ventos do Sul trazem um chimarrão rodeado de amigos para uma conversa calorosa.  A prosa e os versos, no verso e no reverso da conversa que atravessa os muros da discriminação põe por terra a ignorância que impera e emperra, esfria e congela a humanidade em tempos de cura e libertação.
Encostado ao muro, sol na cara, chapéu por sobre os olhos. Tem coisas que é difícil de ver, entender então, quase impossível, O frio da espinha dorsal do preconceito não tem sol que aquente. Quase dormia quando ouviu um grito do outro lado do muro: Negro filho da puta! Era domingo, tinha mal chegado da igreja. Não o negro. Este ficara trabalhando.
Não é frio quando o que aquece são os corações. Orações são necessárias, mas quando o friozinho do outono vem e as folhas ficam avermelhadas buscamos refúgio onde há uma bela palhada, o aconchego de corações que palpitam e compartilham uma bela poesia para aquecer o dia e uma vida inteira de amizade.
Bateu forte no peito: Era um filho da puta! Não o negro, ele mesmo. Nascido na zona do meretrício, agora tem que ouvir as baixarias de quem talvez seja mesmo seu pai. Não o negro, o que voltara da igreja. De reza em reza busca arrependimento e confessa os pecados, depois peca para encher o vazio da alma que não se alimenta. Tem nada não, domingo que vem confessa de novo!
Elairton Paulo Gehlen

sexta-feira, 7 de junho de 2019

(Do Livro: Histórias de Ana Maria e seu avô. Capítulo 1) O CAVALO METUSALÉM


Quando Ana Maria abriu os olhos e viu a mãe que sorria e acariciava seus cabelos, foi logo perguntando:
- É hoje que eu vou para casa do vô passar as férias com ele?
A mãe, na esperança de que a filha acordasse animada para ir à escola, parou as carícias por um instante e ficou pensativa. Ainda não era o primeiro dia das férias, então disse que estava na hora de levantar, lavar o rosto, se vestir e tomar café que ainda tinha uma semana de aulas.
- Uma semana! – Disse Aninha e ergueu as mãos para o alto para demonstrar o tamanho do tempo que isso era. Abriu também os olhos bem abertos para reforçar a medida do tempo. - É muito tempo e eu aprendo mais com o meu avô do que na escola. Bem que as férias podiam começar hoje. Você não acha?
- Acho. Acho que estamos em cima da hora. Pula da cama que o café está na mesa e vai ficar muito triste se você não der atenção a ele.
Aninha levantou-se, foi ao banheiro e disse ao espelho que no próximo final de semana ela teria que o abandonar por uns tempos pois tinha que dar atenção ao vô Júlio. “Ele está muito ansioso e se eu não for talvez ele fique doente, então é melhor eu ir. ” O espelho se conformou. Para essas frases tristes ele não dava nenhuma resposta, mas quando Aninha se arrumava e perguntava se estava bonita, então o espelho devolvia um sorriso largo de confirmação. 
Aquela semana passou lentamente e os cadernos de Aninha voltaram para casa cheios de desenhos do sítio. Uma casa grande, o galinheiro, o curral, a horta, galinhas pelo quintal comendo o milho que a vó tratava. Tinha árvores, bois pastando, um cachorro e o vô com o laço na mão querendo pegar um bezerro.
Quando finalmente chegou o dia, chegando no sítio, foi correndo para perto do vô e parou estática à uns três metros de distância com as mãos na cintura, a perna esquerda um pouco à frente da outra, a cabeça levemente inclinada para a direita e um sorriso incontido no rosto. O vô olhou e ela estava linda, vestindo calças jeans, camisa quadriculada, chapéu de cowboy e botinas nos pés.
- Ouhhh!! Finalmente chegou a minha boiadeira! – Disse o vô com um sorrisão no rosto.
- E aí, vô. Cadê o meu cavalo, eu vim ajudar a separar o gado. – Disse a neta com a segurança de um peão de boiadeiro.
- O cavalo está encilhado, mas antes vem cá que meu pescoço está doendo e só um abraço de Ana Maria consegue curar. Também estou sentindo uma dor aqui nessa bochecha...
- Oh, vô, eu dou um beijo e vai sarar!
Então pulou no pescoço do vô e ficou rodando no ar, abraçou o vô com os braços ao redor do pescoço para tirar a dor e com as pernas ao redor do tronco para ficar mais firme. Deu um beijo bem carinhoso e a dor sumiu das bochechas. E assim, cavalgando firme no peito do vô foram em direção ao curral onde o petiço já estava encilhado para Ana Maria enquanto que ao seu lado estava prontinho para ser montado pelo vô, o cavalo Metusalém.
- Ma-tu-sa-lém - disse a neta querendo corrigir o avô.
- Fui eu que batizei ele e dei o nome de metusalém, então ele se chama me-tu-sa-lém.
- Então tá. É como a mãe sempre diz: manda quem pode, obedece quem tem prejuízo.
Na verdade, nenhum dos dois sabia quem fora ou o que significava Metusalém ou Matusalém. Isso também não tinha a menor importância. O vô dissera que havia colocado esse nome no cavalo depois que alguém o havia xingado desse nome quando, meio desengonçado, saiu da loja da CERGRAND e atravessou a rua sem prestar atenção ao trânsito.
- Ô velho Matusalém – gritou um sujeito de dentro de um carro bacana – saí daí seu velho gá-gá – emendou.
- Metusalém é o cavalo que te criou. – Respondeu Júlio num acesso de raiva.
No dia seguinte comprou o cavalo num negócio que fez com um vizinho. Chegando em casa lembrou-se do cavalo que criara o motorista e, para nunca mais esquecer do episódio, deu nome de metusalém ao cavalo que comprou dizendo que talvez ele crie também um dono de um carro daqueles de luxo que o outro irmão estava guiando.

CHIFRE EM CABEÇA DE CAVALO. EXISTE? EXISTE!

  Já botei no título o que poderia ser uma mentira, a ciência diz que cavalos não tem chifre, nem as éguas, mas na fazenda do Romero, que ...